O Pro Tour Phyrexia foi o primeiro evento oficial e de grande porte com Magic presencial desde os tempos da pandemia, com uma cobertura completa ocorrendo durante os três dias, que apresentou jogo após jogo, escolhas no Draft, entrevistas com competidores, dentre outros elementos que há muito tempo não tínhamos com tamanha qualidade.
Porém, nem tudo são flores: A Wizards também cometeu algumas gafes consideráveis durante o streaming, como falhas na iluminação, posicionamento de câmera e, principalmente, começar uma nova temporada de previews enquanto a final do torneio acontecia.
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Nesse artigo, apresento os prós e contras do evento, sob a perspectiva do espectador.
Falta uma divulgação mais abrangente de um dos maiores eventos profissionais de Magic
Quando entrei no universo de Magic, em 2008, o jogo era ainda era um pequeno nicho de mercado que movimentava um seleto grupo de pessoas que gostavam de card games, RPG e outros elementos da cultura geek. Hoje, Magic cresceu ao ponto de ser uma marca bilionária da Hasbro.
Em 2008, nos pacotinhos de Boosters, vinha uma peça de propaganda na parte de trás dos tokens: alguns promoviam a próxima edição, outros falavam do Friday Night Magic, ou de produtos da linha Ultra Pro, e tinha aquelas que diziam "Play the Game, See the World" - uma frase que ficou amplamente conhecido como característica do Pro Tour, o maior evento profissional de Magic: The Gathering, do qual você conseguia se classificar via um sistema intuitivo de torneios e que também poderia dar-lhe a oportunidade de competir no Campeonato Mundial.
De volta ao presente, é inegável que Magic hoje é mais consumido por um público casual do que por aqueles que visam competir, e tudo em torno do jogo parece ter se movimentado em torno disso: não temos mais SCG Opens e outros eventos terceirizados, os Regional Championships são o que restou da grande festa que costumavam ser os Grand Prix/Magic Fests, e até a maioria do conteúdo produzido sobre Magic hoje tem um teor menos voltado para o universo competitivo.
Mas isso não quer dizer que o Magic competitivo não exista: há centenas de milhares de jogadores dispostos a investir tempo, dinheiro e energia em se especializar em determinados formatos e participarem de torneios em troca de premiações e/ou vagas para grandes eventos. O cerne do jogo, por décadas, foi a competição, e a escala de lançamentos que funcionou por 25 anos tinha como objetivo manter os formatos competitivos frescos e trazer novidades que motivassem jogadores e lojistas a abrirem boosters - E hoje, nós ainda temos um público muito dedicado aos torneios e grandes eventos.
Então, por que poucas pessoas que não estão totalmente engajadas com Magic se importaram com o Pro Tour?. O maior evento profissional do jogo deveria ser algo celebrado e amplamente divulgado nas redes e nas plataformas físicas e digitais. Afinal, se podemos ter inserts de Secret Lair nos boosters e propagandas de bundles no Magic Arena, de que custa um anúncio na página inicial de que um grande evento do qual você pode, inclusive, conseguir participar ao jogar os torneios da própria plataforma, está acontecendo?.
O próprio Benton Madsen, que chegou às finais contra Reid Duke no seu primeiro Pro Tour, se classificou para o evento através do Magic Arena, então por que não propagandear esse momento do qual diversos jogadores sonham em conseguir, enquanto centenas de outros talvez nem sequer saibam que essa possibilidade existe?! Por que não dar à essas pessoas algo do qual elas, talvez, queiram se dedicar?
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Apesar de o casual ser hoje o motor que move o jogo, assistir uma competição de alto nível com jogadas tão elegantes como as que presenciamos nesse Pro Tour é algo bonito, e daria tanto aos que jogam com seus amigos numa mesa de Commander aos fins de semana quanto para a pessoa que abre o Magic Arena no celular durante a volta para casa, algo para ficar interessado, entretido e, talvez, uma razão para se dedicar mais ao jogo mesmo quando a própria empresa já deixou claro que pessoas não devem enxergar Magic como uma carreira.
Propagandear o Pro Tour é valorizar o próprio jogo, os jogadores, a comunidade e os produtos que a empresa quer vender, e enquanto o tratarmos como 'apenas um torneio', como ocorre desde os tempos de pandemia, Magic nunca terá o reconhecimento que merece.
Graças ao Magic Arena, Draft se tornou divertido de assistir
Um dos maiores benefícios que o Magic Arena trouxe para o jogo é que as pessoas se acostumaram mais a participar de eventos como Draft ou Selado para aprimorar suas escolhas e, onde antes esses formatos eram praticamente esquecidos ou tornados obrigatórios para fazerem com que as pessoas jogassem, agora ele se tornou parte da cultura da plataforma digital e quase uma obrigatoriedade para aqueles que querem construir uma coleção sem gastar muito dinheiro.
O resultado é que as pessoas agora interagem mais com as decisões de draft no chat, e as partidas de Limitado se tornaram interessantes de se assistir. Os espectadores passaram a ficar entretidos com quando um jogador abre uma bomba, ou com o desenvolvimento das partidas.
Sim, o Construído ainda é a parte mais fascinante do Pro Tour e também a que mais impacta o mercado e o jogo, mas se houve um benefício na existência do Magic Arena, é que ele melhorou muito a relação entre o consumidor com formatos Limitados.
Espaçamento, Adaptação e Ângulos
Podemos afirmar que assistir ao Pro Tour sempre teve alguns prós e contras durante sua transmissão desde os tempos em que as partidas eram transmitidas pela ESPN (sim, isso aconteceu, há vídeos dessa época no YouTube), e um dos pontos que não mudou é a dificuldade que jogadores possuem de identificar os cards na mesma, e infelizmente, isso é natural em qualquer TCG porque uma imagem de alta definição não é o suficiente para o espectador ler os cards, e esse problema é adereçado através dos comentários dos casters e do uso eficiente de recursos na tela, dois elementos dos quais a Wizards executou com maestria no decorrer desse evento.
Outra crítica recebida pelos espectadores foi a falta de aproveitamento do espaço de tela, que deixava muita informação desnecessária (deckboxes, dados e tokens reservas, etc) expostos. Esse problema foi adereçado no segundo dia de torneio e, no Top 8, as informações na tela durante as partidas estavam incrivelmente bem-alinhadas com o que se espera da cobertura de um evento profissional de Magic.
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E quanto à mudança de ângulo da partida de horizontal (onde o espectador enxerga as cartas de lado, como se estivesse ao lado da mesa) para uma vista frontal, de cima? Há alguns contras que precisam ser ajustados e se tornam um tanto inadmissíveis para uma empresa bilionária, como o excesso de sombra nas cabeças dos juízes ao lado das mesas, mas, em geral, foi uma mudança muito bem-vinda que não só revitaliza a maneira como assistimos Magic físico, como também torna da interface da transmissão bem mais intuitiva para o jogador de Magic Arena.
Há, no entanto, um problema que se tornará desconfortável para os espectadores no longo prazo, principalmente se, um dia, tivermos um Pro Tour em formatos mais antigos, como Modern ou Legacy.
O excesso de variantes torna do jogo mais difícil de interpretar
Você consegue, na imagem acima, identificar quais são os cards que estão na variante Phyrexiana? Você acredita que um jogador recorrente de draft conseguiria identificá-las?
Magic se tornou um jogo com certo excesso de estética e variantes nos últimos anos, e temos cards muito difíceis de identificar - principalmente os da série Secret Lair - mas válidas em torneios, e quando elas são colocadas à mesa, o impacto na simetria e estética da cobertura da partida é gigantesco.
Agora, imaginemos em um formato com uma disponibilidade de cards promocionais mais abrangentes, como o Modern, onde um jogador de Izzet Murktide pode ter quatro cópias do Ragavan, Nimble Pilferer borderless, quatro cópias do Serum Visions de Secret Lair, Steam Vents de Unfinity, lands básicas full frame de Innistrad: Crimson Vow e o que mais ele quiser de versões alternativas e promocionais do seu deck favorito, e ele está no feature match do Top 8 contra um jogador de Hammer Time que possui a versão padrão de todos os cards - o resultado seria uma dissonância entre a identidade do jogo e a imagem que o espectador enxerga na transmissão, uma "linha" que separa os cards que conhecemos com as bordas que conhecemos de uma infinidade de designs diferentes do outro lado.
Então, por mais que agregue ao fator colecionável de Magic, as variantes podem se tornar, facilmente, um problema futuro que distanciará o espectador do jogo por criar uma assimetria entre o que acontece na mesa e o que a tela apresenta. Isso não é uma novidade, no entanto, Masterpieces e Expeditions já existiam antes dessa nova era do jogo, e jogadores as usavam com alguma frequência, então é possível que teremos de nos acostumar com uma maior frequência dessas ocasiões.
Ver bons jogadores pilotando decks presencialmente faz Magic parecer um esporte
Nada é mais interessante em um coverage do que ver jogos bem-executados, e ninguém melhor do que alguns dos melhores nomes que já passaram pela história de Magic para proporcionar esses momentos ao espectador, e os jogos de tabletop acabam por passar um refinamento que as transmissões de torneios no Magic Arena careciam.
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Apesar de haverem outras razões, o principal motivo era a falta de uma plataforma realmente criada para transmissões das partidas on-line, como através de um modo espectador. Ter a cobertura inteira feita através do compartilhamento de tela gera o sentimento de amadorismo à cobertura da qual é imperdoável para, novamente, uma empresa bilionária.
Com esse empecilho fora da linha, ficou claro que Magic parece muito mais um esporte quando não tenta ser um do que quando ele se esforça demais para competir no universo dos E-Sports, onde Hearthstone, Legends of Runeterra e até Yu-Gi-Oh! conseguem estabelecer uma ambientação mais amigável e profissional de seus grandes eventos. E, talvez, a Wizards poderia considerar os ganhos que ela teria em promover sua principal marca não apenas como um card game colecionável, mas como um esporte que recompensa boas decisões entre seus competidores.
Outro destaque do evento é que assistimos aos jogos, um após o outro, sem pausas. Isso nos permitiu um aproveitamento melhor do nosso tempo na transmissão e garantiu diversos momentos empolgantes, como quando abriram uma Sword of Forge and Frontier no draft, ou quando assistimos ao Shota Yasooka pilotar o Rakdos Midrange com maestria, ou quando Benton Madsen mostrou porque Boseiju, Who Endures é uma staple de múltiplos formatos ao usá-la em um timing perfeito, e as várias vezes em que Reid Duke saiu de situações que, normalmente, seriam consideradas impossíveis de se achar uma jogada que salvasse a partida.
Quando o marketing atropela até a final de um Pro Tour, há algo de errado
O último ponto digno de se adereçar sobre a cobertura do Pro Tour Phyrexia é organização, e o que estava indo muito bem durante os dois primeiros dias falhou quando anunciaram que os primeiros previews de March of the Machine* ocorreriam no mesmo dia e no mesmo horário da rodada final do evento.
As consequências incluíram a perda do prestígio que uma final de Pro Tour merecia, a necessidade de uma grande parcela da comunidade de ficar de olho na partida e na timeline do Twitter simultaneamente, a falta de uma transmissão ao vivo dos previews porque estavam transmitindo o jogo, e uma cacofonia tão grande de informações novas em um espaço de tempo tão curto que ofuscou, para muitos, que Reid Duke ganhou o seu primeiro Pro Tour após 13 anos. Até mesmo a entrega do troféu para o campeão mais pareceu o fim de uma festa sem celebração do que um grande marco da história do jogo.
Magic passou por várias dificuldades nos tempos de pandemia e, para muitos que acompanham o jogo há anos, esse Pro Tour foi a primeira experiência de 'normalidade' em anos. Arruinar esse momento atropelando o evento principal com os previews do novo set uma semana após o set anterior ser lançado é um erro fatal que mostra como o setor comercial da empresa parece ter a voz mais alta, e não se comunica com nenhuma das demais estruturas do jogo.
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E terminar um grande final de semana de Magic com previews não é uma ideia ruim. Apesar do timing inapropriado de não aguardar nem sequer 15 dias de aproveitamento do produto mais recente, que outra oportunidade brilhante de deixar a comunidade mais empolgada e encerrar essa grande festividade o qual é o Pro Tour, se não com um preview do que está por vir? Sim, ainda é brincar de burnout de spoilers e produtos, mas se esse é o novo normal de Magic: The Gathering, de que custa o fazer de uma maneira inteligente?
Infelizmente, para o espectador, o Pro Tour terminou com um sentimento amargo de que a Wizards negligencia os jogadores, os eventos e o próprio jogo em prol do marketing e dos produtos, e toda a beleza de acompanhar três dias de grandes jogos com grandes jogadores terminou ofuscado pelo estrondoso eco do novo Omnath, Locus of All.
Conclusão
Isso é tudo por hoje.
O Pro Tour Phyrexia foi o primeiro de muitos eventos oficiais que terão jogos de tabletop como seu principal atrativo. Em termos técnicos, a Wizards aprendeu com alguns erros e, apesar de ainda pecar com certos detalhes, trouxe uma experiência gratificante ao espectador.
Porém, as decisões administrativas da empresa ainda são muito questionáveis, e o que deveria ser uma grande celebração de Magic, terminou com o mesmo lembrete de que o jogo não passa de um produto a ser vendido, e que grandes competições e seus participantes são ofuscados diante dessa máxima.
Obrigado pela leitura!
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