Você sabe o significado da palavra Adágio?
É um provérbio popular com uma mensagem de teor moral, são frases curtas e fáceis de memorizar, comumente implementadas ou aplicadas em situações diversas. Ou seja, um sinônimo menos conhecido para a palavra “ditado”.
Se tem uma coisa que torna da língua portuguesa fascinante é a quantidade de ditados que possuímos na nossa língua. Eu poderia preencher este artigo apenas com ditados brasileiros, mas você com certeza não está aqui para falar de letras, e sim de Magic: The Gathering.
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Quando falamos de Magic: The Gathering, existem diversos ditados, ou adágios, aplicados pela comunidade. Uns muito divertidos, outros muito desagradáveis, e outros são comumente vistos como uma constante reclamação da comunidade.
No Pauper, existem adágios recorrentes, em especial envolvendo a suposta opressão e excesso de flexibilidade do Tron, e a constante predominância dos decks azuis no formato. Em especial, é muito comum você ler ou ouvir a seguinte frase vinda de um jogador de Pauper:
“Os decks azuis estão dominando o formato”
- Jogador de Pauper
Desde que passei a me dedicar ao Pauper, em 2014, já escutei essa frase mais de uma centena de vezes.
Apesar de estarmos apenas na segunda semana do Pauper pós-banimento de Chatterstorm e Sojourner’s Companion, uma afirmação tem sido recorrente desde que o anúncio de banidas e restritas foi feito pela Wizards: Faeries é o melhor deck do formato.
Não é uma conclusão que demorou muito para ser feita pela comunidade, e é particularmente bem simples de chegar-se nela antes mesmo dos resultados do Pauper Showcase: Dimir Faeries foi o único deck capaz de manter-se a par e servir como um regulador contra os dois decks que oprimiam o formato durante estes três últimos meses: Storm e Affinity.
Logo, era de imaginar-se que, como o arquétipo não sofreu nenhum banimento na última atualização (um ponto que, particularmente, considero uma atitude certeira da Wizards of the Coast), o deck permaneceria no topo do formato, como esteve antes do lançamento de Modern Horizons II, onde competia pelo espaço de deck a ser batido junto com Tron e Cascade.
E Faeries tem estado no topo do formato faz muito, muito tempo. E é justamente por isso que estou escrevendo este artigo: para acalmar os ânimos daqueles que já estão considerando o formato desequilibrado após o Pauper Showcase, e, ao mesmo tempo, afirmar e explicar porque acredito fielmente na minha afirmação a seguir:
O Faeries quase sempre será o melhor deck do Pauper
A menos que algo dê muito errado no formato e criemos um estado de polarização que o Faeries não consiga superar, o arquétipo é propenso a sempre estar na posição de melhor deck do formato de maneira quase incondicional, e isso deve-se muito à composição que decks como Faeries possuem nos formatos competitivos quando possuem o suporte certo, independente das mudanças que ocorrerem no formato, porque a sua base é forte o suficiente para lidar com qualquer mudança brusca.
E sabe porque é tão recorrente vermos pessoas comentando sobre o Pauper ser “dominado pelos decks azuis”?
Porque estes decks sempre estiveram presentes no formato.
Fazendo um Flashback
Primeiramente, vamos entender o que é o Faeries e sua trajetória no formato:
O Faeries é, naturalmente, um Tempo deck. Algumas pessoas o categorizam hoje como um Midrange porque o deck possui mais elementos de atrito e uma curva mais alta do que suas versões anteriores ou do que Tempo decks “puros”, mas toda a composição deste arquétipo é muito flexível e depende do contexto de cada formato: um Tempo deck no Standard, como o Dimir Rogues era na season passada, é essencialmente diferente de um arquétipo na mesma categoria no Legacy.
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Eu poderia cavar mais fundo atrás de uma lista mais antiga do Faeries, mas acredito que esta lista, de 2010, seja um bom ponto de partida para entendermos o arquétipo porque ainda não existia Delver of Secrets no formato, e cards como Empty the Warrens ainda estavam presentes no mesmo.
Esta lista fez Top 8 no Pauper Challenge de 10 de Setembro de 2010. O arquétipo era comumente conhecido como MUC Faeries e continha elementos muito mais voltados para o prolongamento do jogo e algumas peças-chave de Card Advantage que hoje já não se encaixam mais no arquétipo, como Mulldrifter, além de aumentar o número de fadas com Pestermite, um card que hoje é praticamente inexistente no Pauper fora de alguns combos estranhos com Familiars, Fertile Ground e Ghostly Flicker.
No Top 8 deste evento, incluíam-se: Storm, Affinity, Goblins, Dimir Flicker, Orzhov Pestilence, Mono-Green Stompy e duas cópias de Mono-Blue Faeries.
Num formato muito diferente do nosso atual, Faeries foi o único deck neste evento a conseguir duas vagas no Top 8.
Então Delver of Secrets chegou e a composição dos decks azuis do Pauper mudou significativamente em prol de eficiência de mana na sua versão mais pura: Gush e Daze tornaram-se Staples dos decks azuis e compuseram o que ficaria conhecido como Mono Blue Delver, lista que era considerada um dos principais competidores do formato e arquétipo que você precisaria respeitar se quisesse competir no mesmo.
A existência (e eficiência) do arquétipo levou à criação de arquétipos que tentavam se apresar dele, como versões mais eficientes de Stompy e principalmente a criação do Kuldotha Boros, deck que conseguia “travar” o jogo do Faeries por fazer jogadas eficientes de card advantage com Glint Hawk e Kor Skyfisher, dois cards que apresentavam um sério problema para o arquétipo.
E então, Cloud of Faeries foi banida. Não oficialmente por conta do Mono Blue Faeries, mas porque outros decks de combo abusavam facilmente do card para os mais diversos loops.
Seria a morte para o Faeries, a comunidade disse. Seria muito ruim para o arquétipo lidar com a ausência do poderoso tempo play de Cloud of Faeries + Spellstutter Sprite no turno 2 para segurar o deck do oponente.
Não foi o que aconteceu. O arquétipo substituiu Cloud of Faeries pela nem tão eficiente, mas muito útil Faerie Miscreant e continuou a fazer resultados, só não se tornando o melhor deck do formato na época porque, pouco depois, Peregrine Drake foi lançado e o Izzet Drake dominaria o formato por meses antes de seu fatídico banimento emergencial.
Então chegou Modern Masters 2017, que trouxe consigo muitos cards que se tornaram essenciais para o formato. Em especial Burning-Tree Emissary, que alavancou o potencial explosivo do Stompy, predador natural do Mono-Blue Faeries, e o jogou direto para o topo do formato.
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Além disso, nessa mesma época, Palace Sentinels saiu para o Magic Online, alavancando o potencial de um deck já bem conhecido na época como outro predador natural do arquétipo e dando origem ao Boros Monarch, arquétipo conhecido no formato até hoje.
O fato destes dois decks ascenderem no formato deveria levar o Faeries ao fundo do poço, tornando-o um Tier 2 que não conseguiria competir com os melhores decks do formato. Mas o deck se transformou, se adaptou, adotou novos cards e fez um ótimo uso do card que também foi lançado em Modern Masters 2017, Augur of Bolas, além de passar a adotar uma nova manabase e um splash.
O deck não podia mais contar com bounces para resolver as permanentes problemáticas, então ele passou a adotar o vermelho para adicionar removals que interagiam muito bem contra estes arquétipos: Lightning Bolt matava diversas criaturas do Stompy se não estivessem fortalecidas de alguma maneira, enquanto também lidava com Kor Skyfisher. Já Skred permitia ao arquétipo lidar com qualquer permanente em jogos mais longos, matando Palace Sentinels ou qualquer outra criatura por apenas uma mana.
A adição de uma nova cor pode ter tornado do arquétipo mais lento, mas dava-lhe a possibilidade de estender jogos e manter trocas mais favoráveis de recursos, permitindo-o contornar as mais diversas situações que decks mais rápidos ou com ameaças predatórias ao arquétipo pudessem lidar, um elemento que vemos até hoje.
Apesar de não ser o deck que possui a base de Faeries que estou debatendo neste artigo, é importante ressaltar este momento do formato primeiramente porque ele precedeu o Blue Monday, o dia em que baniram Gush, Daze e Gitaxian Probe, e segundo porque foi o momento em que os Blue-Based decks foram de reguladores do formato para os opressores do mesmo.
A chegada de Foil ao Pauper através de um downshift de Ultimate Masters tornou dos Blue-Based Decks os absolutos melhores decks do formato por uma margem significativa. Em especial, o Dimir Delver se destacava porque esta inclusão permitia, junto à base de free spells do deck, que ele fosse essencialmente jogado como um deck de Legacy, onde você tinha sua própria versão de Force of Will, que interagia muito bem com as free spells e ainda permitia ao arquétipo jogar tranquilamente ameaças como Gurmag Angler nos primeiros turnos ainda com backup.
Isso levou, após anos de opiniões distintas sobre a predominância dos decks azuis no formato por conta da inclusão de Gush, um card banido dos demais formatos competitivos, ao banimento da categoria de free spells azuis, o que enfraqueceu significativamente o Dimir Delver, deck que procura se aproveitar da maior eficiência de mana o possível, mas que não prejudicou tanto o Izzet Faeries, pois sua lista já estava se direcionando para lidar com jogos mais longos e utilizar a mana de maneira eficiente para suas interações (por exemplo, as listas de Faeries já não utilizavam tantas, ou até mesmo nenhuma, cópia de Daze).
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Depois, Modern Horizons trouxe ao formato Arcum’s Astrolabe, um card que atualmente também é banido de praticamente todos os formatos competitivos, e que praticamente envolveu o Pauper em torno de si mesmo.
Dentre os decks com Astrolabe, o Jeskai é o deck que realmente se destacava e, tecnicamente, tornou-se polarizador no Metagame, pois suas interações eram significativamente eficientes e seu pacote de disrupções era essencialmente o mesmo do Faeries, mas sem precisar dar tantas voltas com sinergias tribais e bounces de Ninja of the Deep Hours, tornando-o um Tempo deck melhor do que o Faeries em todas as categorias.
No final das contas, Arcum’s Astrolabe foi banido e o Pauper voltou ao seu estado natural onde a vaga de melhor deck era disputada entre Faeries, Tron, Monarch e decks que tentavam jogar por baixo.
Por meses, o formato manteve-se neste padrão, o arquétipo passou por pequenas evoluções para acompanhar o formato, como a adoção dos cards de Monarch para obter mais card advantage num formato cada vez mais voltado para jogos de atrito e troca eficiente de recursos, e a adição de Cast Down em Double Masters alavancou uma versão do arquétipo que já aparecia com alguns resultados ocasionais, e hoje é considerado a melhor versão de Faeries do formato: O Dimir Faeries.
O que o Dimir Faeries possui que os outros decks não têm é a capacidade de utilizar Snuff Out, uma das free spells mais eficientes do formato, e que recebeu uma súbita ascensão no Metagame de acordo com como os Black-Based Decks deixaram de ser presentes no formato, enquanto os arquétipos de Tempo precisavam recorrer a alguma eficiência de mana para acompanhar o card advantage dos Midranges e Control, enquanto também poderiam se aproveitar do card para segurar a explosão dos decks Aggro.
Cast Down apenas deu ao arquétipo o slot incondicional que permite a ele lidar com praticamente qualquer ameaça que não se chame Guardian of the Guildpact, tornando-o muito mais eficiente em lidar com ameaças e deixando de lado a necessidade de separar bem seus slots de removals entre cards como Agony Warp, Echoing Decay, entre outros (apesar destes cards ainda serem utilizados se o Metagame demandar que sejam usados).
A adição de preto ao deck também o deu dois elementos muito importantes: Uma engine de constante card advantage que consegue disputar com o Monarch decks com Thorn of the Black Rose, e uma ameaça que acaba com o jogo rapidamente numa mesa vazia e que era difícil de remover, com Gurmag Angler.
O fato curioso é que todas as peças estavam lá, mas nunca haviam sido construídas antes de maneira eficiente, ou o Metagame não estava propenso o suficiente para que esta ideia pudesse suceder.
Então chegou Commander Legends, que trouxe Fall from Favor.
Vou me limitar a dizer que Fall from Favor era uma carta quebrada demais para o formato, ao ponto de decks como Affinity estarem adicionando o card em suas listas, e decks como Mardu Monarch estarem splashando azul apenas para adicionar Fall from Favor.
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O card foi banido rapidamente do formato, meses se passaram de um Metagame relativamente bem equilibrado, mas com Dimir Faeries sempre sendo considerado o deck mais eficiente. Kaldheim trouxe as duais nevadas que trouxeram diversos experimentos para as variantes de Faeries, Strixhaven trouxe Behold the Multiverse e chegamos a Modern Horizons II onde, como já sabemos do passado recente, Storm e Affinity quebraram o formato ao meio... E os únicos decks capazes de segurar ambos os arquétipos de maneira consistente foram Dimir Delver e Dimir Faeries
Recentemente, Chatterstorm e Sojourner’s Companion foram banidos e ocorreu o Pauper Showcase.
A composição dos arquétipos que os competidores utilizaram no evento foi a seguinte:
33 Dimir Faeries
27 Affinity
12 Izzet Faeries
11 Bogles
7 Tron
5 Boros Bully
5 Jund Cascade
5 Gruul Cascade
4 Moggwarts
3 Mono-Black Control
3 Dimir Delver
3 Burn
3 Walls
2 Jeskai Ephemerate
2 Azorius Familiars
2 Mono Blue Delver
2 Elves
2 Boros Monarch
E no Top 16, tivemos:
4 Dimir Faeries
3 Affinity
2 Izzet Faeries
2 Moggwarts
1 Jeskai Ephemerate
1 Bogles
1 Azorius Familiars
1 Boros Bully
1 Mono Blue Delver
E o Top 8 do evento terminou com:
4 Dimir Faeries
1 Jeskai Ephemerate
1 Bogles
1 Affinity
1 Moggwarts
Acredito que a taxa de conversão do arquétipo esteja no esperado dado a quantidade de Dimir Faeries presentes no evento. Na verdade, exceto pelo Moggwarts, que a meu ver teve um resultado bem acima da média esperada, a conversão dos decks ao Top 16 me parece razoável.
Mas é inegável não mencionar que, tanto em ditado popular quanto em resultados, Faeries pode ser considerado, sim, o melhor deck do formato atualmente.
E é onde estamos agora. E agora que analisamos a trajetória do arquétipo, precisamos entender porque o Faeries é um deck tão próximo de onipresente dentre os Tier 1 do formato.
Porque Faeries quase sempre será o melhor deck
Tenho uma afirmação bem recorrente que costumo fazer quando comento sobre formatos competitivos onde o azul é uma cor predominante ou em ascensão: Tempo Decks sempre são propensos a se tornarem o melhor deck de seus formatos se obtiverem o suporte certo, pois agem como reguladores do Metagame.
Normalmente, Tempo decks competem pelo espaço de regulador de formatos contra os decks Midrange porque ambos possuem elementos que dão a eles a flexibilidade necessária para lidar com as mais diversas situações numa partida, mas eles possuem uma diferença crucial entre si:
Os Midranges são decks bons em lidar com diversas situações, mas não lidam com nenhuma delas de maneira excepcional.
Por exemplo, um Midrange pode ser construído para lidar com um metagame onde existe um bom equilíbrio entre Aggro, Control e Combo. Mas suas peças não costumam se encaixar universalmente em cada partida, e um removal na sua mão será inútil contra um Control enquanto um descarte do topdeck será inútil contra um Aggro.
Enquanto isso, os Tempo decks são excepcionais em lidar com diversas situações, e muito ruins em lidar com poucas.
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Por exemplo, a base dos Tempo decks, num contexto geral, é sempre em cima da eficiência de suas respostas universais. O melhor exemplo disso é um card amplamente utilizado no Pauper e no Modern, Counterspell.
Counterspell é um bom card de se ter na mão em quase todas as ocasiões, e um bom topdeck caso sua posição de mesa não seja desfavorável porque oferece uma troca incondicional, independentemente do recurso do seu oponente.
Onde os Tempo decks perdem, entretanto, é quando suas respostas se tornam menos eficientes, algo que normalmente ocorre com o prolongamento da partida. Um Daze no early-game ou contra decks com uma curva gananciosa é uma das melhores cartas que o deck pode querer, mas um Daze no late-game é um dos piores topdecks que você pode imaginar.
Mas faz alguns anos que os Tempo decks parecem estar indo cada vez menos para o espectro de utilizar respostas que percam valor conforme o progresso do jogo: Apesar de Daze ser uma grande staple do Legacy até hoje, podemos ver arquétipos de outros formatos optando por respostas que conseguem ser boas na maioria dos estágios do jogo.
Tenha como exemplo o Izzet Tempo do Modern: Cards como Unholy Heat dificilmente perdem a utilidade. Pelo contrário, eles ficam ainda melhor com o decorrer da partida nas condições certas, e possuem uma flexibilidade em mana e utilidades que dificilmente tornam do card inútil no formato.
Por isso, Tempo decks tendem a ser ruins apenas se os decks com os quais ele está jogando contra exploram suas fraquezas naturais. Como, por exemplo, jogar mais cards e estabelecer uma pressão maior do que o deck se propõe a trocar (como Elves), ou estar fora da curva de “controle” do deck, ou jogar tantas ameaças explosivas que, qualquer uma que permanecer em jogo irá se tornar uma grande ameaça (como Cascade), ou qualquer peça que limite significativamente a quantidade de mágicas e efeitos que o deck pode fazer (apesar de não serem cards do Pauper, posso citar Thalia, Guardian of Thraben ou Chalice of the Void como exemplos).
Por outro lado, Midranges costumam se apresar dos Tempo decks, porque suas respostas costumam ser bem eficientes contra as poucas ameaças que o arquétipo costuma possuir, o que seria o motivo pelo qual o Dimir Delver é um deck que costuma estar em baixa no Pauper faz algum tempo, e o próprio Delver of Secrets se tornou um tanto obsoleto pelo mero motivo de morrer para praticamente todos os removals do formato atualmente sem gerar valor algum.
Mas, no espaço de regulador de formatos, Tempo decks costumam suceder no lugar dos Midrange decks porque eles possuem... Bom, isso:
Como um amante de Delver decks e Tempo decks, em geral, eu adoro falar sobre Turbo Xerox, e nós precisamos falar sobre este estilo de construção de decks neste artigo:
O Conceito de Turbo Xerox
Magic: The Gathering é um jogo baseado, no meu ver, em dois fatores-chave: Recursos e Variância, e eles andam lado a lado ao decorrer de uma partida.
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Recursos são os cards que você utiliza no jogo. Quando você faz uma jogada, você está propondo um estilo de jogo e uma possível troca de recursos com o oponente, ou um aumento de seus recursos, e eles podem ser dos mais diversos: Vida, permanentes, terrenos e, principalmente, cartas na mão.
E aqui entra o fator variância: Você tem os terrenos suficientes para utilizar seus recursos? As cartas na sua mão são boas o suficiente para realizar trocas favoráveis? Seu oponente comprou uma carta que tornou da sua jogada do turno anterior totalmente irrelevante?
Tudo isso é variância, é como o jogo se comporta e, diferente do que costumam dizer, não considero que estes momentos estejam atrelados a sorte, e comumente vejo isso como uma “desculpa” instintiva para não analisarmos o desenvolvimento da partida e aceitarmos que temos algumas propensões a tomar decisões ruins durante um jogo ou até mesmo durante a construção do deck que tendem a nos punir no resultado final, e assumir esta responsabilidade é muito frustrante.
Isso não torna, entretanto, o fator variância menos crucial para o jogo: Se analisarmos o processo de deckbuilding de qualquer deck competitivo, eles têm como objetivo inicial mitigar o fator variância. Seja com tutores, como no Commander, ou efeitos de draw recorrente como Midranges e Controls fazem, ou com um aumento exponencial de ameaças impactantes como o Tron do Modern ou o Eldrazi Post do Legacy faz, ou tendo acesso à maior quantidade de cartas o possível com a menor quantidade de mana, como é o caso do Turbo Xerox.
Comecei o artigo mencionando o significado de adágio, e existe outro adágio utilizado no Magic para explicar as vantagens de decks Control para iniciantes que é “Quanto mais cartas você comprar, mais chances você possui de ganhar o jogo”.
E, particularmente, a frase ideal para esta lógica deveria ser “Quanto mais cartas do seu deck você ver e ter acesso, mais oportunidades você terá de ganhar o jogo.”
E é isso que o Turbo Xerox propõe: A redução da variância com um aumento significativo de meios de comprar cards e manipular o topo do seu deck para remover cards inúteis.
Um exemplo básico desta teoria, criada por Alan Comer em 1998, é que você poderia reduzir uma land para cada duas cantrips que você adicionar ao deck, o que permite não apenas a uma possibilidade menor de topdecks ruins ao decorrer da partida, como também habilita um certo nível de manipulação do grimório quando você as utiliza de maneira eficiente, o que significa que cada draw que você dá pode ser significativamente melhor do que o do seu oponente, criando uma vantagem virtual na partida.
E isso não se aplica somente aos terrenos: decks de Turbo Xerox possuem muito mais facilidade em encontrar os cards que precisam porque eles olham mais cartas do deck e com uma velocidade maior do que a dos demais decks do formato, o que permite ao arquétipo uma ampliação das suas respostas. Você tem maior liberdade e menos punição ao, por exemplo, fazer um Split de Agony Warp e Echoing Decay na sua lista, dado que são cards que enfrentam situações diferentes no Pauper, porque você tem mais meios de encontrá-los ao decorrer da partida ou descartá-los do topo se eles forem inúteis através de manipulação.
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No final das contas, em uma visão ampla, Magic é um jogo de escolhas... E o que cantrips e outros meios de manipulação de topo ou de acesso a mais cards fazem é ampliar as suas escolhas disponíveis e maximizar a quantidade de decisões que você toma ao decorrer de uma partida, dando-lhe mais “possíveis jogadas”.
E por conta de todos esses benefícios eu considero, mesmo após mais de duas décadas desde a sua concepção, o Turbo Xerox uma das formas mais eficientes e poderosas de se construir um deck em Magic: The Gathering, e que se prova eficiente para criar os melhores decks do formato sempre que existe uma base sólida o suficiente para isso.
Izzet Delver no Legacy, Izzet Tempo no Modern e... Dimir Faeries no Pauper.
Turbo Xerox e o Faeries
Quando falamos de decks de Turbo Xerox, normalmente temos a concepção de decks como o Izzet Delver do Legacy, onde se usa uma base que varia de 12 a 16 criaturas, um punhado de counters, removals e muitas cantrips, e quando analisamos o Dimir Faeries, vemos um deck que comumente as pessoas poderiam classificar como um Midrange, em especial porque sua base está muito mais voltada para o atrito, onde a essência dos Tempo decks costuma ser desbalancear o oponente por tempo o suficiente para avançar o seu plano de jogo.
O primeiro erro comum nessa questão é que os tempos mudaram e muito. É só você pensar na qualidade individual dos cards nos últimos dez anos. As criaturas que compõem o Izzet Delver hoje, por exemplo, são criaturas que fazem muito mais do que apenas estabelecer uma pressão na mesa. E o Faeries, apesar de ser um deck que possui a mesma base faz mais de dez anos, segue esta mesma tendência.
Faerie Seer, apesar de não comprar um card, funciona com a mesma natureza do que qualquer cantrip ao permitir a manipulação do topo do deck, comumente interagindo muito bem com Brainstorm ou Ponder.
Augur of Bolas é uma cantrip num corpo 1/3 por duas manas, e também interage bem em remover os cards indesejados do topo enquanto lhe permite “cavar” mais fundo atrás de uma resposta e remover cards indesejados do topo, enquanto segura os turnos agressivos dos oponentes no early game.
Acredito que Spellstutter Sprite e Ninja of the Deep Hours merecem uma menção própria nesta categoria porque são os pilares do deck, literalmente a principal razão pela qual estes decks podem tomar qualquer dano ou banimento no formato e ainda assim o arquétipo permanecerá dentre os principais competidores.
Spellstutter Sprite é o pilar do Faeries. A base que sustenta e dá razão para toda a junção de cards que torna do Faeries o que ele é. O deck provavelmente não seria bom ou não existiria sem ela.
Na pior das hipóteses, Spellstutter Sprite é um pseudo-Snapcaster Mage para Mental Misstep.
Com outra fada em jogo, Spellstutter Sprite será um pseudo-Snapcaster Mage para Prohibit sem pagar o custo de Flashback. E a conta só fica pior se você aumenta o número de fadas a cada turno.
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Somado ao fato de que o Pauper, naturalmente, não é um formato que costuma jogar com a curva muito alta e, até mesmo decks como o Cascade possuem cartas de custo baixo que podem ser respondidas com Spellstutter Sprite, torna dela um dos pilares do formato e um card que você precisa respeitar.
Confesso que, antes do banimento de Daze ampliar a eficiência de Spellstutter Sprite (já que jogar “acima da curva” tornava do seu deck mais suscetível a Daze), e antes de Commander Legends trazer Boarding Party e Annoyed Altisaur, eu considerava que a fada encontrava-se num power level acima do que o formato tinha como proposta.
E confesso que, até hoje, me questiono se Spellstutter Sprite não está, de fato, acima do que o formato se propõe. Afinal, ela é um Snapcaster Mage para counters pontuais. Por outro lado, gosto do espaço de regulador que o Faeries possui para o Pauper atualmente e considero cedo demais para considerar se algo merece estar na banlist ou não.
Se Spellstutter Sprite é o nosso Snapcaster Mage, Ninja of the Deep Hours é uma mistura estranha de Restoration Angel com, por falta de um exemplo melhor me vindo à cabeça no momento em que escrevo este artigo, uma versão muito nerfada de Ragavan, Nimble Pilferer.
Sim, eu sei que compará-lo com Ragavan é uma hipérbole, guardem seus ancinhos, o que estou tentando exemplificar é a forma como estes cards tomam o jogo para si a partir do momento em que entram na mesa: Eles demandam resposta imediata do oponente, criam tanta vantagem se causarem dano ao oponente mais de uma vez, comumente levando o jogo por conta própria, e se beneficiam muito do uso eficiente de seus counters e removals.
A diferença crucial é que Ragavan, Nimble Pilferer funciona por conta própria e não precisa de literalmente nenhum setup ou praticamente nenhuma concessão de deckbuilding para ser ótimo, enquanto Ninja of the Deep Hours depende de um setup eficiente e uma deckbuilding feita para abusar de sua habilidade para ser metade que o Ragavan é, já que uma criatura 2/2 por quatro manas que não possui impacto imediato é uma jogada bem ruim para os padrões de qualquer formato.
Então o Faeries possui a mesma quantidade de counterspells, manipulação e topo e cantrips que um Turbo Xerox normalmente teria, mas acoplados à criaturas, porque o Pauper é um formato onde a combinação de criaturas é tão importante quanto o valor individual delas.
Agora adicione a esta base os seguintes elementos:
Cards que são muito eficientes para o Metagame do Pauper, e funcionam principalmente para cobrir as significativas desvantagens que o deck possui contra outros arquétipos, em especial o card advantage dos Midranges com Thorn of the Black Rose e a falta de um clock eficiente com Gurmag Angler.
Já mencionei acima o quão poderoso um pacote de cantrips eficientes é. E o arquétipo usa o melhor pacote de cantrips que já existiu no Magic competitivo.
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E, por fim, a melhor, mais abrangente e mais eficiente resposta genérica do formato, o melhor removal incondicional, e a única free spell de grande impacto restante no Pauper.
Com este pacote sendo a “essência” do deck, o resto pode ser adaptado ao gosto do jogador, o que significa que o arquétipo tem infinitas possibilidades de se adaptar a qualquer Metagame.
Se você espera enfrentar mais Affinity e decks com criaturas grandes, você aumenta o número de Snuff Out e Cast Down.
Se você espera enfrentar mais decks que populam a mesa como Elves ou Boros Bully, você tem Suffocating Fumes e Echoing Decay.
Se você espera enfrentar Guardian of the Guildpact e outras criaturas difíceis de remover por meios tradicionais, você possui Chainer’s Edict, Agony Warp e Diabolic Edict.
Se você espera enfrentar mais decks de Cascade, você tem Lose Focus.
Se black-based removals se tornarem ruins ou uma ascensão de decks azuis surgir, você sempre pode mudar para a versão Izzet para ter acesso a Pyroblast ou removals como Skred, Flame Slash e Lightning Bolt, e sem perder essencialmente nada da base do deck porque as peças pretas são relativamente substituíveis.
Essa versatilidade faz com que o Faeries sempre possa se adaptar a qualquer Metagame, independente de qual seja ele.
Foi essa versatilidade que tornou do arquétipo o único capaz de jogar em pé de igualdade com os dois decks que quebraram o formato com o lançamento de Modern Horizons II, e o Faeries ainda se beneficiava disso porque, com menos decks presentes no formato, menos amplas precisam ser as respostas, o que permite ao deck dedicar a maior quantidade possível de slots em combater os decks opressores.
Por isso, Faeries sempre será o melhor deck do Pauper, e só perderá esta posição quando o formato estiver num estado polarizado, ou quando um deck quebrado surgir, ou quando um Tempo deck mais eficiente tomar o seu lugar (o que, segundo os precedentes do Dimir Delver pré-Blue Monday e do Jeskai Astrolabe, também indicará um formato polarizado), ou se cards essenciais da sua base, como Spellstutter Sprite, forem banidas um dia.
E não acredito ser necessário, atualmente, realizar uma intervenção direta no arquétipo, pois ele está realizando a sua natureza comum dentro do Magic competitivo, realizando o movimento que temos visto desta categoria de arquétipo em essencialmente quase todos os formatos competitivos eternos.
Afinal, o que significa ser o melhor deck do formato?
O “melhor deck” é o deck que movimenta o Metagame de um formato competitivo. Comumente, será um deck que possui uma winrate positiva ou igualitária contra uma grande parcela do formato, portanto, o deck tende a ter uma maior representatividade nos eventos porque é a escolha segura ou meramente a melhor escolha possível para tentar vencer um evento.
E podem existir dois tipos de “melhor deck” num formato competitivo:
O primeiro melhor deck é o arquétipo que está com um power level significativamente maior do que o restante do formato, tornando-o polarizado em torno de um único deck e afastando do formato qualquer deck que não consiga jogar bem contra ele. Um exemplo recente deste deck no Pauper foi o Storm, que levou ao recente banimento de Chatterstorm.
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O outro melhor deck é o arquétipo que serve como o “fun police” do formato, o deck que possui uma winrate equilibrada contra os demais decks porque possui os elementos certos para isso, seja jogando por baixo deles ou tendo as respostas certeiras para cada situação, criando uma estratégia que consegue vigiar e manter em cheque estratégias que comumente se tornariam injustas na sua ausência.
Estes decks promovem e essencialmente forçam o jogo interativo ao punir o oponente por focar demais no próprio plano de jogo e forçam que os demais decks possuam também meios de interagir, ou serão punidos pelo deck mais interativo, e comumente a sua permanência no topo tende a simbolizar um formato saudável.
Faeries é este segundo tipo de deck. E eu, particularmente, considero ser bom um formato ter esta categoria de deck no topo.
Isso não significa que Faeries sempre será “justo” estando na posição de melhor deck, já que cards novos podem facilmente tornar do “fun police” o próprio opressor do formato. É por isso que cards como Treasure Cruise, Gush e Fall from Favor estão banidos.
Mas não vejo, no momento, o arquétipo ocupando o espaço de deck opressor, apenas o de regulador.
Conclusão
E encerro aqui a explicação de porque o Faeries é e provavelmente permanecerá como o melhor deck do Pauper, algo que particularmente não considero ruim para o formato.
Na realidade, existe uma seção inteira onde comento o que pode ser feito para derrotar Faeries no Pauper. Mas, como este artigo já está extenso demais, vou aprofundar melhor este assunto num artigo próprio, e você pode esperar vê-lo em breve!
O que precisamos avaliar, e ainda está cedo para avaliarmos diretamente, é o fator diversidade do formato: O Pauper esteve, em seu passado recente, no pior estado de toda a sua existência, com apenas três decks sendo competitivamente viáveis. E precisamos, agora, avaliar como ficará a diversidade de arquétipos nas próximas semanas.
Eu prevejo que Faeries estará no topo nos próximos Challenges, e não espero que, somando todas as suas variantes, estes números estejam abaixo de 30%, e precisaremos analisar como estarão os outros 70% do formato, e se a diferença entre este arquétipo e os demais em representatividade não estará gritante demais para o formato.
Ainda há muito para o que se analisar nas próximas semanas antes de tirarmos conclusões sobre a predominância ou não de um ou dois arquétipos no formato, e vamos avaliar estes números com calma antes de cairmos no próximo looping eterno de pedir o banimento de algum card.
Obrigado pela leitura!
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