Antes de começar a leitura deste texto, recomendo ler primeiro meu artigo Magic Mudou para Sempre e Não vai Voltar Atrás. Nele, explico meu posicionamento sobre a recente decisão da Wizards of the Coast sobre aumentar a quantidade de produtos da série Universes Beyond e como minha maior preocupação nesse assunto envolve dois pontos:
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O segundo ponto entrelaça com este artigo: o Standard vai mudar. Agora, deixam de ser quatro ou cinco expansões por ano para serem seis. A distância entre lançamentos agora será entre 45 e 60 dias - haverá mais consumo, mais investimento, mais necessidade de comprar cards novos para manter seu deck atualizado para os RCQs que, na maioria de 2025, serão no formato Standard.
Magic Arena também muda com essa decisão por motivos semelhantes, mas o problema nele vai um pouco além: o free to play foi dificultado. Standard é a porta de entrada do MTGArena e agora jogadores precisarão ter mais cards e atualizar seu deck mais vezes para ter bons resultados nas ranqueadas e até jogar alguns torneios da plataforma, ou eventos independentes.
Investir no Standard agora significa correr o risco do seu deck perder a validade após 60 dias. Se vier o hate ideal, uma carta quebrada, uma expansão que mude completamente o Metagame competitivo ou até um staple instantânea que, por acaso, responde bem ao seu plano de jogo, seu deck foi arruinado e será necessário investir mais para transformá-lo em outra coisa.
Todos esses movimentos parecem orquestrados para fazer com que o Standard seja revitalizado em 2025, torná-lo o formato que mais importa na escala competitiva, a porta de entrada para o mundo de torneios de Magic para os fãs de Marvel, Final Fantasy e seja lá quais outros crossovers a WotC planeja para um dos seus principais produtos, e paira sobre muitas dúvidas sobre como isso afeta o futuro.
Por um lado, a Wizards está no caminho certo em dedicar mais tempo ao formato. O Magic precisa de um Standard forte para manter-se estável em muitas frentes e certamente a mudança de legalidade para Universes Beyond colabora nesse sentido, mas, ao mesmo tempo, a expansão da janela de lançamentos para seis edições visando torná-lo mais dinâmico dificulta a experiência do jogador e a sua capacidade de aproveitar o produto em cada novo set.
Na prática, o que vai acontecer é o mesmo que testemunhamos com o período entre Duskmourn e Foundations: tudo parece mais rápido e um pouco mais difícil de acompanhar, temos menos tempo para absorver informações e aproveitar os novos cards. Mas vamos explorar um pouco mais dos benefícios e riscos que essas decisões apresentam para o Standard e, consequentemente, para Magic.
Standard precisa ser o epicentro do Magic
Durante décadas, o Standard era o premier play de Magic. Se você queria participar de um evento, ir numa loja local, jogar um torneio, você consequentemente precisava começar pelo formato rotativo. Isso não invalidava a existência de outros ambientes: Extended tinha sua própria temporada, tal como o Legacy, e ambos nutriam uma comunidade apaixonada pelo jogo.
Eventualmente, o Extended foi substituído pelo Modern e este também conquistou uma base solidificada de fãs. Depois, veio o Commander que se tornou o formato mais jogado de Magic e, posteriormente, também veio o Pioneer. Hoje, existem tantos jeitos diferentes de jogar Magic que perpassam até a Wizards: de formatos da comunidade abraçados pela empresa como o Pauper até iniciativas visando tirar a WotC da equação como o Premodern, meios alternativos de jogar formatos sem expansões complementares e a conversa sobre um tal de “Voyager” - Pioneer sem Universes Beyond - já começa a aparecer.
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Mas o formato que precisa ser o mais importante do jogo é o Standard. O ecossistema do modelo de Magic como um negócio depende do sucesso dele: a maioria das expansões é feita considerando o Standard, e a ideia de eventos como Pro Tour ou campeonatos de grande escala sempre é de promover o produto.
Um exemplo clássico dessa dinâmica pode ser visto quando aproveitamos Foundations e voltamos para uma década atrás, onde cards facilmente subiam e desciam de preços na semana do Pro Tour conforme elas apareciam no evento. Esse efeito, inclusive, ainda ocorre em todos os países, mas preços agora se movimentam muito mais rápido porque as mídias sociais, somadas com os eventos de Acesso Antecipado e a regionalização de mercados por meio de marketplaces, criam outro padrão de especulações que já se iniciam do dia um em que streamers tem acesso ao material.
Se tirássemos o Standard da equação de lançamentos e/ou reduzíssemos sua participação com mais sets de outros formatos para promover, mais ocasiões de power spike ocorreriam no Magic ao ponto de transformá-lo em um card game voltado para a nova edição sempre ser mais forte que a anterior. Como exemplificado por Mark Rosewater em seu blog, é mais fácil balancear um formato rotativo do que inserir cards diretos em um formato eterno. Sets como Modern Horizons sempre cometem algum erro por conta desse desafio - para uma edição fazer sucesso inserindo cards no Modern ou Legacy, eles precisam ousar mais com o design, tentar coisas mais arriscadas e essas podem implodir o Metagame com muita facilidade, basta ver alguns exemplos recentes:
Não é necessário mencionar o estrago que Nadu, Winged Wisdom fez no Modern, mas além dele, The One Ring ainda é o card mais jogado do formato, com mais de 50% de representação, e o Boros Energy conta com quase 30% de presença nos torneios competitivos. Os três casos vieram de um set suplementar designado para o Modern, e The One Ring seria repensado mais vezes e jogado mais vezes durante a produção de Lord of the Rings se esse set tivesse saído para o Standard.
O Standard torna tudo mais cuidadoso nesse sentido, mas não é imune a erros: Oko, Thief of Crowns, Uro, Titan of Nature’s Wrath, Field of the Dead e os Companions vieram de expansões padrões e causaram estragos em todos os formatos. Valki, God of Lies provocou uma mudança nas regras da mecânica de Cascade e uma dúzia de cards lançados em sets padrão se tornaram quebrados no Pioneer, e enquanto alguns foram erros grotescos de design, outros apenas tinham interações com outros cards de outros formatos - e não é dever do design de Standard gerenciar essas interações.
Quando uma expansão é feita para o Standard, situações como as de Treasure Cruise ou Valki, God of Lies são efeitos colaterais que precisam ser remediados através de banimentos, enquanto Oko, Thief of Crowns ou Companions são erros de design bem aparentes. A última intervenção no formato ocorreu em maio de 2023, nós estamos há um ano e meio sem banimentos no Standard. Sim, tivemos Geological Appraiser e Amalia Benavides Aguirre no Pioneer, tivemos também Up the Beanstalk no Modern, mas o ambiente para onde as expansões têm sido planejadas está no cenário mais estável da sua história desde 2019.
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Criar um ambiente estável significa estabelecer segurança de investir. Jogadores podem comprar cards sem medo, treinar para grandes torneios sem a preocupação de perder seu deck no meio do processo, ou precisar mudar seu Sideboard inteiro devido a um banimento, e nesse sentido, eu não poderia concordar mais com a inserção de Universes Beyond como parte do ecossistema do Standard.
Universes Beyond no Standard é uma boa decisão
Vamos esquecer o nível de poder de alguns cards e imaginar que Lord of the Rings: Tales of Middle-earth tivesse saído para o Standard. Não muito diferente de hoje, pessoas ainda reclamariam que outra IP está valendo no formato rotativo, mas a edição teria lançado com toda a mesma categoria de produtos apresentada para LotR - que provavelmente será o mesmo padrão de Final Fantasy e Marvel - e os jogadores usariam seus respectivos cards em decks.
No mundo ideal, os fãs de Lord of the Rings conheceriam Magic: The Gathering, tal qual eu ou você conhecemos ele de alguma maneira no passado, e se interessariam pelo jogo. Desse momento, este fã tem duas opções:
A mesma regra se aplica aos jogadores que conheceram Magic ou se aproximaram do jogo por meio de LotR em 2023. A diferença está na abordagem de formato porque o nível de poder do Modern não permite que os cards de LotR tenham tanto espaço. Sim, The One Ring tem 52% do Metagame, Orcish Bowmasters mudou a maneira de jogar com cantrips e, sim, Samwise Gamgee tem um combo com Cauldron Familiar, Delighted Halfling é o melhor mana dork do formato e Flame of Anor virou uma staple com Tishana’s Tidebinder, mas esses são seis ou sete cards em quase 300.
Você consegue ganhar jogos ou sequer competir com um deck de Aragorn, the Uniter em um FNM de Modern? Como Gandalf the White se compara com o nível de poder de uma Solitude? Lord of the Rings tem filosofia de Standard em muitos cards e algumas coisas ocasionais com nível de poder de Legacy, não diferente de War of the Spark! Até as interações de cards como Lorien Revealed ou Troll of Khazad-dûm são efeitos colaterais dos ambientes de seus respectivos formatos, ao invés de uma consequência do power level natural da expansão!
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Então como esse fã de LotR se sentiria quando ele chegasse ao Modern com seu deck de White Weenie com Flowering of the White Tree apenas para descobrir que ele está perdendo no turno 3 ou 4 para um tal de Yawgmoth, Thran Physician ou um combo com Primeval Titan do qual ele não entendeu metade do que seu oponente fez mesmo após terem explicado para ele?
Por isso, colocar Universes Beyond no Standard é uma ótima decisão se o plano é introduzir os fãs para o jogo Magic: The Gathering e movê-los para a escala competitiva que, novamente, o Standard precisa. Flowering of the White Tree jogaria com Thalia, Guardian of Thraben e Skrelv, Defector Mite, que jogariam ao lado de Frodo, Sauron’s Bane e Samwise the Stouthearted no seu baralho de White Weenie, que contaria com Reprieve como interação e complementada com Werefox Bodyguard. Adicione Minas Tirith e você tem um deck funcional em níveis de FNM e até RCQs, que cria uma união harmoniosa entre os universos Magic: The Gathering e o de Lord of the Rings!
O fã de LotR ficaria muito mais satisfeito em jogar com um deck como o apresentado acima, e tem um pouco mais nele além da sinergia entre cards: exceto por Skrelv, Defector Mite, todas as criaturas da lista se encaixam na estética de Lord of the Rings, e não foram escolhas intencionais.
O foco era mostrar um exemplo de deck funcional que opera entre os universos de Magic e das IPs externas, pois este é o objetivo da Wizards quando a empresa decide incluir os sets de Universes Beyond no Standard, e o Standard precisa desse suporte para ser relevante de novo - e ele sendo relevante novamente, todo o ecossistema de Magic ganha: dos jogadores de Commander que receberão lendárias mais balanceadas ao entusiasta de Modern que não precisa se preocupar com uma rotação forçada o tempo inteiro.
Mas a Wizards tomou outra decisão, e uma que pode ser seu maior erro nas tentativas de revitalizar o formato: incluir três edições de Universes Beyond no mesmo semestre.
O Excesso de Universes Beyond pode prejudicar o Standard
Considere o exemplo dado acima: o jogador de Lord of the Rings está satisfeito com seu Mono White Legends no Standard, aproveitando os torneios na sua loja local, considerando participar da temporada de RCQs da sua região e, repentinamente, ele descobre que a próxima expansão de Magic trouxe um card perfeito para sua lista: , 2/3, Criatura Lendária que oferece Flash para suas outras criaturas lendárias e não permite que elas sejam anuladas. Ela pode ser sacrificada para suas criaturas saírem de fase - a criatura que ele tanto sonhou para suas partidas contra Control - e ele finalmente vai ler o nome do card: Barry Allen, também conhecido como o The Flash da DC Comics.
Ele continua olhando a edição e descobre que tem um novo terreno que que entra em jogo desvirado, perfeito para aumentar a consistência com a qual ele consegue transformar Frodo, Sauron’s Bane em uma ameaça que vence jogos, mas ao olhar para a ilustração do card, ele vê apenas um prédio gigante da Central City sem qualquer significado para ele.
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A lore de Innistrad que inicialmente o fez adicionar Thalia, Guardian of Thraben e o arco de Phyrexia que lhe fez comprar Skrelv, Defector Mite foram agora substituídos por um produto que pouco apetece ao fã de fantasia medieval. Ele continua vendo os cards: Captain Cold, Abra Kadabra, uma dúzia de personagens e lugares com os quais ele não só não se importa, mas sente que não pertencem ao mesmo mundo que o seu deck com seus cards de Lord of the Rings - e o mesmo fã de DC, super empolgado com a expansão de The Flash, tem a mesma sensação sobre os livros de Tolkien. Esses dois mundos, para algumas pessoas, não se comunicam.
Existe um motivo pelo qual todos os decks de Commander de Universes Beyond vêm com 100% das ilustrações daquela IP: fãs têm um preciosismo imensurável pelas suas marcas favoritas. Se você adicionar um Llanowar Elves, você já quebrou o senso de imersão do fã, o produto já vale menos aos olhos dele, então quando você o introduz ao produto Magic: The Gathering e deseja que ele permaneça acompanhando o TCG e participe de eventos de Standard, você já tem o desafio de o imergir com o universo de MTG e fazer com que ele aceite participar daquele mundo.
Um ponto muito positivo em 30 anos de construção de mundo é que Magic é muito diversificado, então é relativamente fácil encontrar uma parte da sua lore que agrade a uma determinada demografia: fãs de Lord of the Rings vão preferir os mundos de fantasia medieval e/ou mundos mágicos com guerreiros e feiticeiros. Fãs de Marvel ou DC Comics encontrarão nos Planeswalkers e talvez em Oath of the Gatewatch e nos arcos maiores da história o elo narrativo que, de certa maneira, combina com aquilo que pode lhes agradar nos quadrinhos. Para o fã de Final Fantasy, não faltam elementos inerentes de MTG que podem se comunicar de alguma forma com o seu jogo favorito da franquia.
Agora tente convencer um fã de Final Fantasy que, para vencer jogos, o Dr. Octopus merece um espaço no seu deck com Cloud Strife e Noctis Lucis Caelum? Tente convencer o fã de Homem-Aranha de que ele precisa do Sephiroth para ganhar um torneio de Magic? Se já está sendo difícil convencer uma parcela dos jogadores de MTG como a nova realidade vai envolver precisar da Lightning e do Peter Parker no seu deck para competir em um torneio, imagina fazer isso para alguém que não passou anos jogando Magic?
Antes, a Wizards of the Coast precisaria convencer o fã de cada uma dessas marcas sobre o universo de Magic. Agora, ela não precisa mais só vender o universo de Magic para o fã de uma IP (e já arrisca falhar quando tudo parece uma referência ou um estereótipo, como em Murders at Karlov Manor ou Duskmourn), ele precisa vender outras IPs no processo.
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Se a proposta é inserir esses jogadores no Standard e no cenário competitivo, a empresa precisa vender Magic e Final Fantasy para o fã de Marvel e Marvel para o fã de Final Fantasy. Esses dois produtos se vendem bem por conta própria, mas não se comunicam para todos os fãs de ambas as marcas.
Todo set é feito para vender. Foundations deixa claro que o próximo Standard será mais rápido, dinâmico e, talvez, com um nível de poder maior. Não tenho dúvidas de que ambos Final Fantasy e Spider-Man serão expansões tão fortes quanto Bloomburrow ou Duskmourn, se não mais fortes que elas, e jogadores precisarão dos cards de Universes Beyond para competir em torneios, o individuo que entrar pelo Cloud Strife precisará do Venom, a pessoa que se interessou no competitivo de MTG com um card poderoso do Miles Morales terá de considerar inserir não só toda a estrutura de Magic no seu deck como também adicionar um pássaro gigante chamado Chocobo.
Não há outra opção quando se quer competir. E esse é um dos motivos pelos quais Universes Beyond em expansões de boosters deveriam ser um produto anual: ele puxa os fãs de uma marca para o Magic, as expansões passadas e futuras do ano fazem o jogador conhecer o universo do card game, os personagens, a lore, as mecânicas, talvez ele se interesse pela viagem interplanar de Edge of Eternities, talvez ele goste do conceito de clãs em Tarkir: Dragonstorm, é possível que ele se encante com Wilds of Eldraine e fique comovido com a lore conforme ela se desenrola, quando menos se espera, esse fã de Marvel ou Final Fantasy agora também é um fã de Magic porque teve tempo o suficiente de conhecer e processar as informações do vasto universo do TCG.
Quando sair o próximo Universes Beyond, este será um jeito de atrair uma nova safra de jogadores, enquanto é uma boa e empolgante mudança de ritmo tanto para os fãs de Magic de longa data quanto para essa pessoa que entrou por causa de FF ou Marvel, o ciclo se repete. Magic cresce, os crossovers continuam sendo colaborações especiais e não ficam saturados. Pelo contrário, começam as especulações e desejos pelos próximos crossovers em expansões de Standard.
Um novo tipo de Magic: The Gathering nasce sem precisar explorar e extrair o máximo de tudo ao mesmo tempo, um que trabalha com harmonia a relação entre desenvolver sua própria marca enquanto traz mais públicos de outras franquias com um produto anual, celebrado pela maioria e sem explorar o máximo possível no curto prazo de uma novidade em um produto com potencial de crescimento de longo prazo. Quer um segundo produto de crossover? Ótimo, pegue uma marca e faça quatro decks de Commander! Todos ganham!
Três expansões de crossover em um ano vão saturar Universes Beyond e piorar a imagem pública do Standard para quem deveria se interessar nele. Como, em 2026, podemos convencer alguém de fora a jogar o formato quando as decklists incluírem Cloud Strife ao lado de Peter Parker e jogando com seja lá qual for o terceiro set do segmento para o ano que vem? Como eu posso esperar que a pessoa leve Magic: The Gathering como um jogo competitivo e não um “wannabe Fortnite” em formato de papelão colorido?
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Que senso de identidade Magic está me dando para eu falar para meus amigos que nunca ouviram falar do TCG que “esse jogo é incrível!” ? Eu sei que esse jogo é incrível, apesar de o J. Jonah Jameson estar numa decklist com o Kefka e uma tal de Sheoldred, the Apocalypse, mas como posso convencer as outras pessoas a levar MTG a sério quando o próprio jogo não parece se levar a sério? Como vou explicar que a história do pequeno Loot é incrível quando tem um personagem aleatório de cada outra marca no meio do caminho?
Se a Wizards não mostrar que o Standard é incrível junto - e, para alguns, apesar - da sua mistura de crossovers, como o formato vai crescer? E como a empresa pretende demonstrar que investir constantemente, muitas vezes centenas de dólares, em pedaços de papelão é um bom negócio para pessoas que gastam 60 dólares a cada alguns anos em um novo jogo de Final Fantasy? Para esse, precisamos de outra solução.
O “novo Standard” precisa de Challenger Decks
Foundations é uma ótima porta de entrada para o Magic: uma coleção de cards que valerão no principal formato competitivo durante 5 anos é exatamente o tipo de investimento que o consumidor quer fazer, mas ele não é perfeito.
Seu maior erro foi o de não inserir Check Lands como seus terrenos duais: esse ciclo - nascido nos Core Sets - é universalmente bom sem desbalancear determinadas métricas, como seria o caso de Shock Lands, Triomas ou Fetch Lands. Eles são tão bons quanto a base de mana disponível, onde se temos muitos terrenos desvirados que não possuem tipo, eles não são necessários, mas se temos uma mana mais conservadora e/ou com mais tipagem, eles são o manafixing perfeito - tudo isso enquanto recompensam jogadores com terrenos que entram em jogo desvirados em muitas ocasiões.
Outro motivo pelo qual esse ciclo merecia o reprint é porque eles são universalmente baratos, é fácil para um jogador pegar alguns deles para sua lista mesmo quando existem opções melhores e isso importa porque uma gama muito grande de jogadores vai entrar em Magic com Universes Beyond, e a primeira barreira que eles enfrentarão ao pensar em jogar Standard e competir no TCG é financeira.
Pode não parecer, mas gastar entre 150 e 450 dólares em um monte de papelão colorido é muito dinheiro para quem enxerga do lado de fora. Uma assinatura de Final Fantasy XIV é 15 dólares para a pessoa jogar o mês inteiro, uma figure recente do Homem-Aranha, em uma pesquisa rápida, pode custar qualquer valor entre 80 até 400 dólares - Magic estará pedindo para essas pessoas que elas devem investir mais dinheiro em outro hobby, ou que deixem de consumir um produto para consumir outro, e este com uma volatilidade ainda maior que aqueles com os quais eles estão acostumados.
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Como convencer, portanto, que vale a pena gastar 300 dólares em um set de Sheoldred, the Apocalypse? Ou pior, dizer para alguém que ele precisa investir 300 dólares em quatro pedaços de papelão colorido se quiser competir em torneios? De que maneira eles podem enxergar que um set de Faerie Mastermind vale o mesmo preço de um jogo Triple A recém-lançado? Por qual razão um fã de Homem Aranha investiria esse dinheiro em um monte de cards que podem perder valor daqui a 45 ou 60 dias ao invés de outra figure, que ficará na estante do seu apartamento por toda a eternidade e só vai valorizar com o decorrer dos anos? Ou naquela versão rara e colecionável dos gibis que ele sempre desejou?
Para essas pessoas ficarem, o Standard precisa manter um padrão baixo de preços nas suas bases e criar uma porta de entrada convidativa, e elas necessitam de facilidade de acesso ao produto - os Challenger Decks resolvem os dois problemas e ainda facilitam a inserção de sangue novo no formato.
Um dos elementos que sempre ajudaram na popularidade do Standard nos eventos semanais em lojas locais é o Pick and Play. Nada é mais atrativo para alguém novo em um formato do que ter um produto que você pode encontrar em qualquer loja, comprar, abrir, sentar em uma mesa e jogar. Há lojas, inclusive, que oferecem decks competitivos prontos à venda por esse motivo.
Os Challenger Decks são esse produto e com o bônus agregado de, quanto mais deles são abertos, mais o mercado é inundado com algumas staples essenciais.
Nem é necessário ir tão longe ao ponto de reprintar Sheoldred, the Apocalypse, basta dar aos jogadores acesso às staples elementares do formato e eles vão conseguir o resto! Dê a eles terrenos duais bons e cards fundamentais para o cenário em que o produto foi planejado! Faça com que remoções baratas permaneçam baratas, faça com que a próxima Fable of the Mirror-Breaker mantenha-se em um preço acessível, torne-os fáceis de achar nas caixas, inunde o mercado com cópias para suprir uma possível demanda crescente e mostre, assim, que vale a pena jogar Standard!
Challenger Decks ajudam a trabalhar na fundação do formato e no futuro problema que ele enfrentará em 2025 e, talvez, nos anos posteriores, inclusive quando pensamos no outro grande desafio do Standard para 2025.
O Dilema das Seis Edições
Um problema recorrente em Magic nos últimos anos é a sobrecarga de produtos e o burnout que eles têm causado em uma parcela dos consumidores. Antes, existia uma frase para responder a essa questão: “Nem todo produto é para você”. Talvez, ela fizesse sentido no momento em que foi proferida pela primeira vez, pois tratava de expansões como Commander Legends e Modern Horizons, categorias de produtos segmentados para um público específico e que nem todo jogador de Magic precisa acompanhar.
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A janela de lançamentos de 2025, entretanto, joga esse conceito fora ao tornar todas as edições do ano válidas no Standard e consequentemente no Pioneer. Vale lembrar que elas nunca vem sozinhas como Booster sets: teremos Commander decks para cada uma delas, Collector Boosters, Starter Kits certamente farão parte das edições de Universes Beyond e seja lá quais outros produtos a Wizards tiver em mente de produzir nesse segmento - agora, todo produto é, de alguma maneira, para todo mundo.
Para o jogador de Standard, isso significa precisar acompanhar tudo e consumir os produtos em um espaço de tempo mais curto:
Não foram divulgadas as datas de Spider-Man e do terceiro set de Universes Beyond, mas a média dos lançamentos agora está em menos de dois meses. Ele está mais próximo da distância entre Duskmourn e Foundations (49 dias) ou Bloomburrow e Duskmourn (56 dias) do que de Outlaws of Thunder Junction e Bloomburrow (105 dias) e de Murders at Karlov Manor para Outlaws (70 dias).
Em teoria, isso significa pouco para o panorama maior do Standard porque Metagames estão sendo resolvidos muito mais rápido hoje do que eles eram na era pré-mídias sociais, no entanto, isso afeta diretamente o aproveitamento do consumir com o seu produto, o qual é essencial para manter uma relação saudável entre jogador e jogo.
O Standard é muito mais sensível às mudanças de uma expansão para outra. Um novo ciclo de duais já muda toda a estrutura e habilita decks de três cores com mais facilidade, um novo card em Duskmourn transformou Archfiend of the Dross de uma variante de Abyssal Persecutor para um dos cards mais poderosos do formato e o lançamento de Authority of the Consuls pode comprometer a posição do Gruul Prowess como melhor deck - agora, o padrão será disso acontecer com a mesma velocidade com que aconteceu em Duskmourn, só que com mais frequência porque são seis expansões ao ano.
A Wizards não está só pedindo que invistam mais rápido no formato, mas que também invistam mais. Se alguém investe, em média, 300 dólares por edição de Standard, agora ele terminará o ano tendo gasto 1.800 dólares em Magic ao invés de 1.200 ou 1.500, e quem antes se preparava para esse custo com 100 dólares por mês precisa agora se preparar com 150, talvez 200 se especular que a edição será boa.
Não bastasse, pela volatilidade com que o formato se transforma, as chances de o seu deck ser invalidado com a próxima expansão crescem. Se seu deck é o Dimir e a próxima expansão lança um suporte muito grande para três cores, jogar com significa estar com uma versão inferior de algo que um Esper ou Grixis estão fazendo melhor. Se você começa a jogar com Elfos em Foundations e eles reprintam Plague Engineer na próxima expansão, sua partida contra todos os decks com preto no Metagame torna-se muito pior e acaba, novamente, se entrelaçando com o problema acima com Universes Beyond: como convencer os novos jogadores a acompanharem?
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Magic é um hobby caro. O Standard atual é relativamente saudável em preços porque temos alguns arquétipos viáveis com valores de 100/200 dólares fazendo resultados ocasionais, e para cada um deles, existe um deck de 500 dólares também fazendo resultados. Se o power creep crescer, teremos a próxima Sheoldred, the Apocalypse custando 400 dólares no playset. Com algum azar, teremos o próximo The One Ring custando 150 dólares a cópia.
Mesmo que esse cenário mais catastrófico não ocorra, é necessário pensar nos meios de fazer o investimento de 100 dólares do iniciante valer a pena e fazer com que ele invista mais 100 nas próximas expansões. No universo de MTG, isso é feito com mecânicas novas e cards empolgantes que entram em determinadas estratégias, como um fã de White Weenie que gosta da ideia de jogar de Soldiers porque se encaixa no seu tema favorito enquanto conta com as sinergias inerentes ao tipo de criatura.
Para o fã de Universes Beyond, o desafio é maior porque se trata de produtos de fora da IP, alguns que envolvem uma terceira marca além da sua favorita e um card game chamado Magic. Se já existe o problema de convencer o fã de colocar outra marca no seu deck, será ainda mais difícil convencê-lo quando essa carta custar 50 dólares.
O fim do Free-to-Play no Magic Arena
Esse último tópico não é tão diretamente relacionado ao Standard em 2025, temporadas de RCQs e ao Universes Beyond, mas o Magic Arena é muito afetado pelas mudanças propostas pela Wizards no próximo ano.
Sempre que li alguma postagem e/ou assistia a algum vídeo sobre o projeto de revitalizar o Standard, notava a ausência de qualquer menção ao principal fator que evita jogadores se interessarem no formato em lojas locais: Magic Arena. Tenho certeza de que o MTGA é muito benéfico para Magic e contribuiu ativamente para o crescimento do jogo e o reconhecimento dele como o conhecemos hoje, mas, por conta da pandemia, ele só não é bom para o Standard presencial.
Afinal, o que faria um jogador do MTGArena pensar em jogar o Standard presencial? O principal motivo de jogar o formato sempre foi dele ser o premier competitivo de Magic. Hoje, o sonho de participar de um Pro Tour é atrativo apenas para uma parcela de jogadores e a ideia de jogar Standard na sua loja local é certamente menos atrativo como jogo social do que uma mesa de Commander na mesma loja. Se ele não é afeiçoado no conceito de jogos presenciais e opta pela praticidade de poder iniciar uma partida de Magic em qualquer lugar e a qualquer momento, não existem motivos para ele trocar a tela do seu celular ou PC pelas mesas e playmats.
A Wizards, em partes, parece ter entendido que há um problema de comunicação em ter o MTGArena como plataforma gratuita - e dizer isso até nos advertisings dentro do booster - para jogos de Standard enquanto tenta promover o formato na mesa, e como não é possível apenas cortar o aspecto free to play da plataforma - a maioria esmagadora de usuários do MTGArena são jogadores free to play - e nem abolir os formatos Limitados ou reduzir sua quantidade de recompensas, optaram por dificultar o “farming” ao lançar mais expansões em um ano.
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Vamos usar meu exemplo, que é longe de ser a experiência completa do free-to-play: como criador de conteúdo cujo material de Standard é integralmente produzido no Magic Arena e com uma média diária entre duas e três horas de partidas por dia, posso afirmar que essa mudança afeta alguns fatores no meu processo. Alguns envolvem, por exemplo, a temporalidade dos artigos, mas a parte que realmente importa nesse assunto é o consumo dos produtos.
O Magic Arena tem uma boa estrutura para quem quer jogar de graça baseada no consumo do seu tempo em dois fatores: recompensas diárias e jogar Limitado. Em teoria, o sistema é entrelaçado para você fazer suas recompensas diárias e usar as moedas para jogar Draft e “farmar” a expansão ao investir várias horas jogando draft para conseguir mais gemas e boosters até fechar o set inteiro de tudo o que você quer. Nesse sentido, o Magic Arena ganha no quanto seu usuário fica na plataforma.
Mas eu, por exemplo, sou um jogador que valoriza muito o meu tempo e uso minhas horas de jogo para treinar com decks, estudar eles e preparar guias, então invisto minhas moedas em Boosters na loja virtual sempre que uma nova coleção sai: faço as recompensas diárias no início de uma temporada, coleto as moedas e uso elas no início da próxima temporada.
Para um criador de conteúdo, isso não é o suficiente para garantir uma pool extensa de cards da nova coleção para testar e experimentar, então sempre compro o bundle de preorder. Dependendo da edição, é necessário investir algumas gemas para conseguir tudo o que preciso: se os cards raros e míticos se sobreporem ao resto do formato, se um ciclo de dez terrenos duais foi lançado, se eles soltaram alguma coleção paralela aos moldes da Mystical Archives, que valem em formatos como Historic ou Timeless, ou se a coleção tem mais raras do que o esperado por qualquer outro motivo - compensa para mim pelas minhas prioridades, mas não é uma prática que recomendo para o jogador habitual.
O resultado prático da mudança para seis expansões será de ter menos dias para coletar recompensas diárias e a desvalorização do Passe de Maestria como o conhecemos hoje (caso não tenham mudanças nele no próximo ano), consequentemente, ter menos recursos para investir na expansão seguinte, o que significa menos wildcards raros e míticos, o que leva para a compra de bundles ou gemas para aquisição de boosters e/ou jogos de Limitado.
O Magic Arena vai ficar mais caro de jogar, mesmo que você não invista um centavo nele. E, tal qual nas mesas presenciais, a Wizards perde que seus jogadores não apenas consumam mais, mas que também consumam em menos tempo. No caso do MTGArena, o tempo de jogo passa, então, a valer menos: são menos recompensas diárias por temporada e menos tempo para farmar Limitado, ou a necessidade de gastar mais horas do seu dia na plataforma para manter um "farming" eficiente.
É engraçado que a crítica mais construtiva que existia na maioria dos comentários sobre o formato Alchemy era sobre a necessidade de precisar investir mais recursos nele do que no Standard porque ele tinha sua própria gama de edições, totalizando em torno de oito sets por ano. Agora, o Standard terá uma janela de lançamentos com seis, 50% a mais do que tinha e 50% a menos do que Alchemy, mas com proporções potencialmente maiores já que cada produto é um full set com 300 ou mais cards.
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Quais opções restam para o free-to-play?
O melhor conselho, hoje, para manter o estilo “free to play” no MTGArena e pode ser migrado também para os jogadores que não querem investir o tempo inteiro no draft e precisar mudar de deck de Standard a cada 50/60 dias em 2025 é de focar em uma estratégia e permanecer com ela até a rotação.
Vamos supor que você tenha iniciado essa temporada com o Gruul Prowess. Em Duskmourn, você investiu em Heartfire Hero, Emberheart Challenger e posteriormente pode ter investido em Manifold Mouse e Innkeeper’s Talent. Duskmourn lhe deu os seguintes cards: Thornspire Verge, Leyline of Resonance e Turn Inside Out, talvez com Ghost Vacuum no Sideboard.
Ao todo, você investiu algum número entre 4 e 10 raras e 4 comuns com Duskmourn. Se você já jogava com alguma versão de Prowess antes da rotação, você investiu até 12 raras e cerca de 12 a 16 incomuns entre o maindeck e o Sideboard do seu deck com Bloomburrow. Manter essa distribuição a cada 50 dias é um desafio improvável, mas é possível manter sua lista e ir atualizando-o conforme parecer pertinente.
Foram-se os tempos onde, como free-to-play, era possível investir Wildcards raros em algo que parece legal, mas sem resultados: cada um deles, em 2025, valerá 50% a mais do que valeu na maioria desse ano para o Standard. Será necessário usá-los com cautela, e ela naturalmente vem como consequência de precisar acompanhar mais detalhes e conteúdos antes de decidir que a próxima Leyline vermelha vale seu investimento.
Para onde vamos agora?
Mark Rosewater confirmou em seu blog oficial que o planejamento para o Standard, no momento, é de seis expansões por ano. Esses planos podem mudar? Sim, tal qual a percepção sobre Universes Beyond mudou em três anos. Será em breve? Não. Principalmente se as vendas de 2025 forem um sucesso.
O mesmo vale para a quantidade de lançamentos de outras IPs em um ano. Esse é o planejamento para 2025, pode ser igual em 2026, pode ser que decidam que uma, ou duas expansões por ano é o suficiente, ou pode ser que, em 2029, eles decidam que Universes Beyond é o futuro do Magic ao ponto de compor cinco ou mais edições em um ano.
Inclusive, é impossível não olhar para Universes Beyond como o futuro de curto prazo do jogo: o Secret Lair da Marvel quebrou o site de pré-vendas, virou notícia em portais que nem são do universo de TCGs, criou repercussão e demonstrou como os crossovers são um sucesso apesar do negativismo de uma parte do público nas mídias sociais. Esses bundles provaram que, tal qual em outros aspectos da vida, o mundo das redes não reflete consistentemente o mundo real.
Independente do que o futuro reserva, o Standard será o formato mais afetado agora que todas as edições de um ano passam a valer para ele. É difícil imaginar onde e como ele estará em 2026, quando uma mudança tão brusca afetará seu ecossistema. Só me resta torcer para que, graças - ou apesar delas -, o formato volte a ser o centro de Magic: The Gathering enquanto jogo competitivo, porque Magic fica mais saudável quando ele é o foco do design.
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