Há aproximadamente um mês, o jogador profissional e game designer Brian Kibler lançou um vídeo onde comenta sobre o atual estado do formato Standard de Magic: The Gathering e quais cards ele baniria para tornar do formato mais saudável: Monstrous Rage e Up the Beanstalk.
Kibler afirma que estes cards comprimem o formato. Há muitas maneiras de interpretar essa palavra, mas gosto da definição tradicional de exercer pressão. Ele tem um ponto: existem cards em formatos que vão comprimir o resto da pool disponível e o Metagame por serem mais eficientes isoladamente ou em conjunto do que comparado com novas ou velhas opções.
Tome, por exemplo, Deadly Dispute. O card acabou de ser banido do Pauper porque criava o mecanismo de vantagem em cartas mais eficiente do formato ao ponto de homogeneizar a construção de decks em torno da sua interação com Ichor Wellspring, sendo necessários motivos muito bons para usar outras interações ou mecanismos ao invés dela.

Monstrous Rage e Up the Beanstalk, junto de This Town Ain’t Big Enough, são este exemplo no Standard. Eles compõem a tríade dos melhores decks do formato (Red Aggro, Domain Overlords, Esper/Dimir Bounce) porque, em conjunto com os demais cards disponíveis, eles criam as estratégias mais eficientes do formato — aquelas que tem mais chances de vencer torneios e, consequentemente, são mais jogados.
Apesar da sua ampla experiência em game design e também em Magic competitivo, meu take particular é de discordância com a proposta de Kibler. Não porque acredito que ele está errado nas suas afirmações, mas porque card games são compostos por essa natureza de sempre haver alguns melhores decks em detrimento de outras estratégias menos eficientes, e os meios de adereçar esse problema são sempre paliativos e/ou geram mais instabilidade em várias frentes.
É possível remover Monstrous Rage, Up the Beanstalk e This Town Ain’t Big Enough e ainda teremos um arquétipo com performance melhor que os demais da sua categoria e este será o deck de escolha daqueles que pretendem ganhar torneios. É feita uma troca de X para Y obtendo o mesmo resultado, e mesmo na possibilidade de existir uma diversificação de arquétipos no topo da cadeia competitiva, este efeito não tende a durar no Standard porque cada coleção pode puxar o power creep — basta pensar no que Duskmourn fez com o formato — e fazer consequentemente o cenário girar em torno de um set, tal qual Khans of Tarkir fez quando foi lançada em 2014.
Isso é o card game competitivo em sua essência. Recentemente, fiz uma entrevista para o nosso canal com o Carlos Eduardo (Campeão do Calling São Paulo de Flesh and Blood), e ao mencionarmos a sua escolha de deck (Aurora, Shooting Star), ele foi enfático em dizer que ele queira o arquétipo que lhe desse as melhores chances de vencer com as melhores jogadas possíveis.
Quando olhamos para o universo do Pokémon TCG com a nova rotação que começou agora, em abril, o que mais vemos são pessoas testando o novo Tera Box pela sua ampla versatilidade no atual cenário competitivo que o torna o potencial novo Tier S.
Em todos os casos, jogadores vão escolher os decks mais eficientes com as melhores cartas possíveis se eles quiserem vencer. Por isso, parece pouco razoável a ideia de banir cards do Standard meramente porque eles comprimem o resto do formato. Sempre haverá um ou mais decks fazendo isso, e o problema está quando uma estratégia está comprimindo o resto — foi o caso que levou a uma série de banimentos no Modern durante os últimos dois anos.
O que existe no Standard é um Metagame. Se peças forem tiradas, o Metagame continuará a existir e nem todo deck conseguirá ganhar ou ser competitivamente viável nele. Alguns arquétipos serão sempre melhores que muitos.
Os Pilares do Standard e o Equilibrio do formato
Para melhor elaborar o cenário, vamos nos aprofundar em qual é exatamente o estado do Standard hoje. Ao invés de falar de decks, é mais importante abordar cards no formato hoje baseado no conceito de pilares.
Pilares são os cards que definem o formato e mantêm o potencial equilíbrio dele. A lógica foi originalmente concebida para o Vintage, mas pode ser transferida para todos os formatos competitivos. Staples como Force of Will e Wasteland, por exemplo, são considerados pilares do Legacy pela sua contribuição em prevenir estratégias degeneradas.
Os pilares do Standard não podem ser considerados com base no que eles previnem, mas no que eles habilitam e a maneira como elas ditam o rumo das partidas e do Metagame. Hoje, temos três pilares maiores e três suportes menores. São eles:
Os Pilares Maiores

Monstrous Rage é o maior (mas não o único) habilitador de quase todos os Red Aggro do formato. Isso inclui as listas de Prowess nas variantes Mono Red, Boros e Gruul e as listas de Mice nas mesmas combinações de cores. Sua principal função é passar dano e manter uma evasão permanente na sua criatura enquanto desencadeia as habilidades delas — enquanto ele é excelente com qualquer criatura, ele se destaca quando existem micro-interações possíveis com ele.
O que faz Rage se destacar no Standard hoje é o fato de existirem muitas cartas que se beneficiam consideravelmente dela. Tome, por exemplo, o pacote de Mice: qualquer um entre Heartfire Hero, Emberheart Challenger ou até Manifold Mouse pode facilmente se transformar em uma ameaça gigantesca com um Rage na mão, fazendo com que o oponente precise jogar em torno dele ou garanta o timing certo de interagir.
O problema no card é que ele faz muito por apenas uma mana. Se ele fosse um +3/+1 com Trample apenas no turno em que ele é conjurado, Monstrous Rage já seria suficientemente bom para merecer slots no maindeck de qualquer um desses arquétipos, mas o fato dele crescer permanentemente suas criaturas, somado com as várias interações que mencionamos aqui, o tornam quase tão bom quanto um Temur Battle Rage em um Death’s Shadow (se você não jogou o Modern em 2017, isso significa “tão bom quanto ganhar o jogo em um combate”).

Up the Beanstalk pode ser considerado um erro de design. Ele se repõe na mão do seu dono quando entra e basicamente contribui para jogar com cards de valor de mana alto, mas o problema é que existem muitos efeitos de custos reduzidos no formato como Leyline Binding, Ride’s End, This Town Ain’t Big Enough, os recém-lançados Rakshasa’s Bargain e Kin-Tree Severance, além de todo o ciclo de Overlords de Duskmourn.
O resultado é que Beanstalk garante vantagem em cartas recorrentes por um custo muito baixo em decks com a capacidade de jogar o go big, e quando estes possuem interação barata que interage com o encantamento, torna-se ainda pior.
Como podemos ver tanto em Aetherdrift quanto em Tarkir: Dragonstorm, esses custos alternativos, redutores, ou meios distintos de conjurar cards com valor de mana cinco, ou maior continuarão sendo lançados em 2025 e provavelmente nos próximos dois anos, tornando de Beanstalk um card que só ficará mais eficiente conforme novos cards serem lançados.

E por falar em mais eficiência a cada novo lançamento, This Town Ain’t Big Enough seria um card outrora ignorado, mas cuja mudança de filosofia no design de Magic o tornou uma das staples mais poderosas do Standard e do Pioneer nos últimos anos.
Magic se tornou um jogo mais relevante na mesa do que na mão. A quantidade de power plays — cards que você joga, faz um efeito e/ou cria um estado de jogo que o oponente precisa resolver ou ele perde — se tornou maior nos últimos seis anos do que era durante todo o tempo anterior a isso, e hoje todo card precisa ser empolgante, e a melhor maneira de garantir essa sensação é fazendo com que eles tenham impacto imediato.
Isso faz do Bounce o que ele é hoje. Fear of Isolation, por conta dessa mudança, se tornou quase tão bom quanto um Snapcaster Mage para os padrões atuais do jogo. E outra certeza que podemos ter é que efeitos de ETB empolgantes e poderosos continuarão existindo enquanto Magic for um jogo — Afinal, é muito mais empolgante jogar e acompanhar uma partida feita na mesa do que na zona secreta das mãos dos jogadores.
Nesse mundo, This Town Ain’t Big Enough é um dos melhores efeitos de reutilização existentes no formato, além de carregar uma versatilidade sem igual no Standard ou Pioneer hoje.
Os Pilares Menores

Cut Down é a remoção que garante a existência de jogos justos para os Midranges. Sem ele, os Red Aggro teriam uma predominância maior e decks go-wide teriam mais espaço e estes, juntos, poderiam suprimir as variantes de Beanstalk.
Sua existência garante o equilíbrio do formato e permite aos Midranges pretos existirem em um universo de Aggros rápidos e Bounce. Do outro lado do espectro, cards como Go for the Throat permitem aos Midranges existirem em um mundo de Domain Ramp, mas ainda sendo apresado por eles.

Stock Up é o pilar mais recente e pode, no futuro, ser o mais importante deles. Um mini-Dig Through Time revitalizou o Control do formato e deu mais consistência para Midranges azuis e para a possibilidade de combos como os de Omniscience e Abuelo’s Awakening existirem.
Ele é e permanecerá sendo a espinha dorsal dos decks azuis por muito tempo, até surgirem cards mais eficientes. Dado que ele encontrou lar até no Legacy, talvez ele se torne um dos principais pilares do Standard no pós-rotação.

O último pilar é Abhorrent Oculus. Apesar dele não ter uma função parecida com os demais cards acima, ele é um dos melhores cards para construir listas em volta e conseguir ganhar jogos com a possibilidade de burlar seu custo de mana, habilitando estratégias e arquétipos que tenham como principal objetivo “jogar Oculus o mais cedo possível e protegê-lo”.

Outros cards que poderiam ser categorizados como importantes, mas não se encaixam exatamente como pilares, são Sheoldred, the Apocalypse, Enduring Curiosity e Unholy Annex como parte da espinha dorsal dos Midranges com preto no formato hoje, Knight-Errant of Eos para os decks de Convoke que são hoje o deck go wide de maior sucesso, e Sunfall como o sweeper que todo jogador precisa respeitar vindo de Azorius Control, Domain Ramp, entre outros.
Remova um pilar e o teto desaba
Juntos, os três pilares maiores compõem o Metagame e os menores ajudam a manter o equilíbrio e o sustento dele. Por serem as peças maiores, Monstrous Rage, Up the Beanstalk e This Town Ain’t Big Enough vivem uma espécie de pedra-papel-tesoura entre si, onde um se apresa do outro.
Consequentemente, remover qualquer um deles do Standard sem retirar os outros faria o formato se desequilibrar para um dos pêndulos, então seria necessário remover os três cards de uma única vez e deixar o formato se reconstruir a partir disso.

A mesma medida foi tomada no último anúncio no Pauper. Kuldotha Rebirth e Basking Broodscale eram os corações de dois dos melhores decks do formato — um deles com padrões de jogo bem problemáticos — e o banimento delas faz com que os jogadores precisem reinventar o Metagame.
Primeiro, surgirão os arquétipos que não foram afetados, seguido por aqueles que se beneficiam de não enfrentar mais partidas contra Kuldotha Red e Broodscale Combo. Depois, o formato começará a passar pelas transformações causadas pela mudança de perspectiva — cards que antes não eram usados se tornam mais relevantes, estratégias que se apresam de um deck X ou Y que está no topo nas primeiras semanas crescem, e assim o ciclo se mantém até criar estabilidade: os melhores arquétipos são postos e o formato se desenvolve no seu ciclo de pedra-papel-tesoura.
Dada essa transformação que um banimento triplo (ou até duplo, como Kibler sugere) pode causar, a janela de 30 de junho parece de fato a mais assertiva para pensar em mudanças no Standard. Ela já representa um cenário onde jogadores estão se preparando para a rotação que ocorre em 1 de agosto com o lançamento de Edge of Eternities, e dar espaço para que eles possam se preparar para o novo Standard enquanto exploram as possibilidades do pós-banimentos é uma ótima maneira de manter o formato engajado.
Sim, isso vem em detrimento de um tempo de inércia a mais no Standard — e convenhamos, ele está inerte desde Duskmourn — e da sensação de que o formato estagnou e que estamos enfrentando os mesmos decks há meses. E ele está sendo potencializado por outro fator.
Um problema da rotação de três anos
Os sets de Magic provavelmente só passaram a considerar a rotação de três anos a partir de 2025, ou em 2026. Até lá, apesar de mudanças poderem ser feitas durante o playtest e design considerando a ampliação da longevidade de alguns cards, a maioria deles já existe em um escopo de conjuntos, e os resultados iniciais de termos essa ampliação do ciclo é notória para alguns casos.

Um deles, por exemplo, é que Zur, Eternal Schemer e o ciclo de Overlords não foram feitos para jogarem juntos, mas estão interagindo entre si e compõem um dos melhores decks do formato.
O resultado da rotação de três anos é que mais decks mais eficientes aparecem com mais frequência. A mana é melhor (listas de três cores não têm qualquer concessão hoje), a interação entre cards é amplificada, e fica mais difícil para cards novos impactarem o Metagame quando tem tanta coisa boa competindo com eles.
Um produto mais “mediano” como Aetherdrift ou uma expansão de core set como Foundations não têm muita chance nessas circunstâncias. Cada edição precisa passar por um acréscimo de poder nos seus cards para impactar o Metagame, ou precisa interagir muito bem com algo já existente para obter o mesmo efeito — em ambos os casos, eles passam a sensação de um formato estagnado se não conseguirem.
Isso não significa que a rotação de três anos foi um erro. O Magic está priorizando um Standard estável e estabilidade é mais importante do que qualquer discurso de mídia social — este é um problema nosso. Nós nos tornamos mais imediatistas enquanto sociedade, e cabe a nós consertarmos a maneira como percebemos a realidade e o tempo ao invés de esperarmos que o mundo sempre gire em torno das demandas e reclamações no Twitter ou Reddit.
Com três anos, há mais aproveitamento do seu produto, e a tendência mais recente de Magic tem ido para um rumo de fazer as pessoas aproveitarem o máximo possível desses produtos, pois querem cativar um público que ainda não está acostumado com ele através do Universes Beyond. Três anos podendo jogar com cards de Final Fantasy significa muito para quem é fã de Final Fantasy e gostou de Magic.
Não podemos, entretanto, descartar que as consequências são bem notórias. Alguns arquétipos serão menos eficazes por coisas existirem por mais tempo, e outros podem nem sequer ter espaço para testes porque há estratégias muito melhores, e se olharmos novamente para esse mesmo fã vindo de Universes Beyond, é pouco empolgante o seu deck de Cloud Strife ou Spider-Man não fazer nada em um torneio.
Nesse caso, há uma divisa sensível: o Standard sofreu muito com uma dúzia de banimentos entre 2017 e 2025. Também sofreu com a quantidade de vezes que essas intervenções vinham sem anúncio prévio. Seria então a possibilidade de aproveitar essas janelas de lançamentos específicas para reformular o formato quando necessário a cada seis meses uma opção?
Jogadores ficariam satisfeitos, ou diriam novamente que jogar Standard é colocar dinheiro no lixo, já que, além desses banimentos a cada seis meses, haveria também em torno de quatro até seis sets em um ano que poderiam mudar o formato por completo? Haveria tranquilidade em jogar um Standard tão dinâmico por ambos banimentos e power creep ao ponto de o formato mudar a cada 60 dias?
Afinal, o Standard precisa de banimentos?
Como mencionei no começo do artigo, não parece que o Standard precisa de banimentos pelos motivos que tendem a provocar intervenções em formatos competitivos. Apesar de existirem melhores decks e cards que são as espinhas dorsais deles, há diversidade no Metagame e meios de interagir com cada um deles de forma que nenhum seja predominante demais.
No entanto, a possibilidade de intervenções de manutenção, não diferente do ocorrido no Pauper recentemente, é uma boa maneira de manter o formato interessante. Mas ele precisa ser feito com o timing certo, e talvez o fazer no ciclo pré-rotação seja este momento.

Nesse caso, banir os três pilares maiores e ver como o Metagame se desenvolve sem eles enquanto aguardamos a chegada de Edge of Eternities é uma opção viável e provavelmente prudente para balançar um pouco as coisas.
Mas há outro card que debatemos pouco sobre, mas está no cerne do vermelho hoje, deve permanecer assim durante a próxima temporada e pode causar tantos problemas quanto causa hoje, mesmo sem Monstrous Rage:

O pacote de Mice é muito eficiente. Tão bom ao ponto de ser hoje um dos melhores decks do Pioneer também, como demonstrado pelo Arena Championship, e a interação de Manifold Mouse com Heartfire Hero e Emberheart Challenger é uma prova do potencial de resiliência que o arquétipo possui.
Uma das principais linhas de jogo dos Red Aggro hoje envolve conjurar Heartfire Hero no primeiro turno, torcer para não haver um Torch the Tower de maindeck na mão do oponente e partir para a agressão no segundo com Manifold Mouse. No terceiro, Hero se torna uma ameaça difícil de interagir porque qualquer remoção ganha o risco extra de ser respondido por um pump. No final, o que serviria para prevenir seis de dano acaba causando seis de qualquer maneira, e ainda pode trazer outra criatura caso seja um Turn Inside Out.
Com Monastery Swiftspear e Cacophony Scamp caindo na próxima rotação, o potencial explosivo dos Red Aggro será, até o momento, voltado principalmente para Heartfire Hero mesmo que outras opções existam e que devem substituir Swiftspear, como Kellan, Planar Trailblazer.
Removê-lo significa fazer as linhas de Manifold Mouse ou um plano de Mice muito menos eficiente sem determinadas concessões de deckbuilding, além de tirar o drop que mais pune remoções dos decks vermelhos hoje.
Pode-se argumentar que o problema está em Manifold e como ele garante o pacote completo para Heartfire Hero e Emberheart Challenger, mas não creio que um deck de Mice seria viável sem a inclusão dele, e o objetivo desse potencial banimento seria enfraquecer os Red-based Aggro, não invalidar completamente um arquétipo que não é remotamente competitivo hoje em comparação com os seus pares.
Concluindo
Isso é tudo por hoje!
Em caso de dúvidas, fique à vontade para deixar um comentário.
Obrigado pela leitura!













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