Há aproximadamente um mês, uma incomum de Outlaws of Thunder Junction causou alvoroço nos torneios de Standard quando jogadores uniram o card com uma base de permanentes e mágicas que possuem efeitos de ETB poderosos, dando origem aos arquétipos conhecidos como Bounce, primeiro nas cores de Esper () e, posteriormente, com uma versão Dimir () mais voltada para o atrito.
Agora, não apenas os decks de Bounce são as estratégias mais estatisticamente eficientes do Standard, como também tem elevado, torneio após outro, a posição de um dos arquétipos mais jogados do formato, e contra o qual muitas estratégias não possuem respostas suficientemente boas para lidar. A conversa entre jogadores, aos poucos, deixa de ser sobre como derrotar Bounce para girar em torno de “descarte deveria ser nerfado” ou, em alguns casos, “This Town Ain’t Big Enough deveria ser banido”.
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Mas, afinal, estamos mesmo diante do novo nêmesis do Standard com o poder de tirar do formato seu potencial de diversidade? Ou estaria o Metagame tão viciado em respostas e soluções rápidas para os problemas do formato que os jogadores não conseguem ainda se adaptar a uma nova estratégia emergente apesar das respostas disponíveis?
O Caso dos decks de Bounce
Bounce é uma estratégia amplamente conhecida nos TCGs há anos e não se diferencia muito no Magic de arquétipos de Blink, onde o objetivo é extrair o máximo de valor dos seus cards ao devolvê-los para a mão ou reutilizá-los direto do campo de batalha. Essa estratégia também é conhecida em outros jogos e já foi considerada bem problemática no Marvel Snap por algum tempo.
O histórico de Bounce no Magic data mais de dez anos, e seu maior expoente competitivo e que mais se compara com o novo nêmesis do Standard hoje veio do Pauper: o formato de comuns possui um arquétipo que reutiliza efeitos de ETB com criaturas que voltam permanentes para a mão tem mais de dez anos, e a iteração mais conhecida desse arquétipo hoje é o Boros Synthesizer, hoje voltado para uma versão Mardu .
O plano do Synthesizer envolve usar Kor Skyfisher e Glint Hawk para voltar permanentes como Experimental Synthesizer e Refurbished Familiar para a mão e jogá-los novamente para extrair valor do seu efeito de ETB. As origens dele datam em torno de 2014, quando ele nasceu como uma resposta ao Mono Blue Delver.
É fácil enxergar as similaridades dos decks de Bounce do Standard com as suas vertentes do Pauper: Nurturing Pixie e Fear of Isolation são, respectivamente, Glint Hawk e Kor Skyfisher, e cards como Hopeless Nightmare estão para ele, assim como Refurbished Familiar está no formato de comuns.
Só que o Mardu Synthesizer não me parece a variante mais comparável com os decks de Bounce do Standard porque a qualidade individual dos cards no formato é notoriamente melhor. Seria necessário voltar um pouco mais no tempo, para uma versão hoje banida do Pauper:
All That Glitters foi quebrado no Pauper. Se Cranial Plating foi o primeiro card banido do formato, não fazia sentido uma Cranial Plating em forma de Aura ser aceitável.
Primeiro, óbvio, os jogadores aproveitaram o encantamento em variantes distintas de Affinity, mas logo ficou claro que esses decks perdiam demais o fôlego, e era melhor procurar um arquétipo que pudesse se portar melhor contra as respostas do Metagame - este foi o Boros Glitters, que deu ao Boros Synthesizer um “hit-kill” com All That Glitters enquanto mantinha toda a base de atrito que tornou o arquétipo famoso. Sozinho, o encantamento deu ao arquétipo algo que ele sempre careceu: um clock.
É onde entra Stormchaser’s Talent. Em tese, este encantamento cria uma ficha de Monastery Swiftspear por uma mana e o potencial de o reutilizar para criar mais fichas e ainda recorrer a This Town Ain’t Big Enough com um dos seus níveis garante mais alcance e um clock que transforma o Esper Bounce em um Midrange muito eficiente com jogadas de Tempo que pressionam até os mais rápidos dos Aggros se eles não conseguirem ser mais rápido - adicione Nowhere to Run e Hopeless Nightmare na conta de outros cards que voltam para a mão e fica muito difícil conseguir jogar na corrida contra eles.
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Por fim, existe o problema de This Town Ain’t Big Enough: ele é eficiente demais porque é muito flexível. Podemos o usar para dar bounce em duas permanentes baratas e jogá-las novamente, dar bounce em um Stormchaser’s Talent e em uma criatura do oponente para tirar bloqueadores do caminho, remover fichas de jogo, proteger nossos cards de sweepers, entre outras opções que o colocam como um dos cards mais poderosos da temporada atual do Standard.
E no meio dessa bagunça, há outro fator importante.
Nem todo deck de Bounce é igual.
As versões de Esper são mais famosas porque vieram primeiro e seu plano de jogo é mais objetivo: o teto da skill dele é teoricamente mais baixo porque a ideia envolve jogar encantamentos, voltar eles para a mão, pressionar com Optimistic Scavenger e Stormchaser’s Talent e vencer o jogo. Suas escolhas de Sideboard são complexas, mas o foco do deck é bem direcionado - teoricamente, ele é mais fácil de responder também.
O Dimir Bounce, por outro lado, flerta tanto com o Dimir Midrange que dificulta saber, nos primeiros turnos, qual lista você está enfrentando se o oponente não vier com uma combinação específica de cartas. Ele parte mais para o lado do atrito, conta com mais fontes de card advantage, tem mais espaço de crescimento em Metagames refinados e pode até mudar por completo para um Midrange com cards como Preacher of the Schism e Sheoldred, the Apocalypse.
Enquanto seguem o mesmo tema e tem o famoso “botão da vitória” com turnos explosivos envolvendo vários casts de Stormchaser’s Talent, Esper e Dimir jogam de maneiras distintas, tem vantagens e desvantagens diferentes no Metagame e, consequentemente, as mesmas respostas não funcionam da mesma maneira contra ambos.
O Dilema do Descarte
Outro fator comumente mencionado como um problema no Bounce é como ele promove uma estratégia de “anti-jogo” com Hopeless Nightmare, já que podem reutilizar o card repetidas vezes para esvaziar os recursos da mão do oponente muito rápido, levando ao ponto de jogadores considerarem banir o encantamento como uma solução para o problema.
Particularmente, não compartilho dessa perspectiva porque respostas para Hopeless Nightmare existem e o seu problema está muito mais nos dois de dano extra que ele garante a cada bounce do que no efeito de descarte. Sim, ficar sem cards na mão no terceiro turno é pouco divertido do ponto de vista casual, mas a quantidade de slots necessários para isso acontecer deveria ser um detrimento e não uma vantagem dos decks de Bounce - se há um problema, ele não está em Hopeless Nightmare.
Que Respostas estão disponíveis hoje?
Uma vantagem do Standard com rotação de três anos é que a amplitude de respostas e cards interessantes aumenta consideravelmente. Por ironia, essa vantagem pode ser um problema para os decks de Bounce porque, da mesma maneira que ganhamos mais remoções, sempre ganharemos também outros efeitos de ETB eficientes que podem - e devem - ser reutilizados para extrair valor.
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Um dos principais desafios contra Bounce é que, além das variantes distintas, esses arquétipos também atacam por muitas frentes. Vamos seguir o exemplo do Esper Pixie, a versão mais famosa do arquétipo hoje.
Logo, para responder apropriadamente aos Bounces, precisamos de:
Remoções Baratas
O Standard está cheio delas, mas aquelas que lidam com criaturas sem condições e/ou que podem lidar com mais de uma categoria de permanente, ou com mais de uma criatura com um único slot, têm uma vantagem.
Invalidar os Cards do Oponente
Cards que invalidam e/ou pioram os bounces do oponente nas permanentes dele, ou nas nossas. Hoje, esses podem ser divididos nas seguintes categorias.
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Com o que jogar para vencer contra Bounce?
A pergunta que toda a comunidade de Standard está fazendo nesse momento. Pelos números, dois arquétipos se destacam hoje contra Bounce, especialmente contra Esper Pixie.
O primeiro e mais evidente é o Selesnya Tokens, ou Selesnya Cage. Em partes, este deck parece feito para tentar vencer Bounce: além da inserção recente de Wilt-Leaf Liege para responder Hopeless Nightmare, ele conta com tantos efeitos de ETB que geram valor imediato e criaturas que punem Nowhere to Run e This Town Ain’t Big Enough ao deixarem outro corpo no campo de batalha que parece muito difícil extrair valor de devolver permanentes para a mão do oponente.
O Selesnya Cage teve, em média, 64% de vitórias contra o Esper Pixie no Spotlight Series Atlanta, e sua winrate geral no evento também foi boa contra Dimir Midrange e Azorius Oculus, enquanto abaixo do desejado contra Gruul Aggro e horrendamente ruim contra Domain Ramp.
O outro arquétipo que teve bons resultados contra Bounce no Spotlight Series foi o Azorius Oculus, apesar de com números mais baixos que o Selesnya Cage. O principal motivo parece óbvio: ele capitaliza demais em cima do descarte de Hopeless Nightmare e sua eficiência em mana é tão baixa quanto a do Bounce, então enquanto ele conseguir proteger suas ameaças (a maioria com evasão) e manter Temporary Lockdown na mesa nos jogos 2 e 3, ele tem uma vantagem significativa na partida.
Vale ressaltar outras duas estratégias que tiveram um bom desempenho contra as variantes Dimir, mas que não foram boas contra Esper. Mono Red Aggro foi um desses casos e, sinceramente, qualquer Red Aggro pode sempre tentar jogar mais rápido e ir para a race, ganhando o jogo antes que o oponente consiga estabilizar - o problema é que o Sideboard deles costuma estar pronto para atrasar seus planos entre dois e três turnos.
Jeskai Convoke segue essa mesma lógica de que há partidas onde conjurar Knight-Errant of Eos cedo demais e acompanhado de Imodane’s Recruiter no turno seguinte vai ganhar o jogo por conta própria. Ele também tem a vantagem de que, como suas criaturas tem efeitos de ETB e corpos pequenos na mesa, cards como Nowhere to Run ou bounces significam muito pouco e geram um valor muito baixo.
Por fim, há o caso do Golgari Midrange. Os seus resultados no Spotlight Series foram um dos piores do evento e a taxa de vitórias contra Bounce também deixaram muito a desejar. Ainda assim, as cores possuem todos os critérios mencionados acima para criar uma lista capaz de ganhar de Bounce.
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O problema é que o Golgari Midrange está em uma posição péssima com o Metagame, em geral, apesar da sua alta popularidade. Na verdade, jogar com ele passa a sensação de que você está sendo justo demais com uma Sheoldred, the Apocalypse no quarto turno, enquanto há duas ou mais fichas de Stormchaser’s Talent, ou um Abhorrent Oculus no terceiro turno, ou quando precisamos esgotar todas as remoções para lidar com o Gruul Prowess apenas para perdermos porque Screaming Nemesis travou nossos meios de ganhar um fôlego extra.
Além disso, quanto mais o Golgari se dedicar na partida de Bounce, pior ele pode ficar contra o resto do Metagame. A troca de Obstinate Baloth no lugar de Sheoldred, the Apocalypse não é benéfica, por exemplo, contra Dimir Midrange. Tranquil Frillback, enquanto flexível e um pesadelo de devolver para a mão do dono, é um card condicional em alguns jogos e mágicas como Maelstrom Pulse, que ajudariam a lidar com várias cópias de encantamentos e/ou com as fichas de Stormchaser’s Talent, são lentas demais contra Aggro.
Nesse caso, o Dimir Midrange poderia ser uma opção mais confiável entre os Midranges, mas sua taxa de vitória contra Bounce - especialmente Dimir - foi abaixo do desejado. Por outro lado, a flexibilidade de cards na sua combinação de cores permite ir para um plano mais orientado para Faerie Mastermind e Faebloom Trick junto de Enduring Curiosity, que pode gerar um fluxo de card advantage difícil de combater, mas se o plano é apostar na eficiência de mana para gerar valor agregado, não seria então o Dimir Bounce uma opção melhor?
Decks de Bounce são uma Consequência Natural de Design
Há um último ponto para adereçar neste artigo: cards como This Town Ain’t Big Enough não são um erro de design. Sim, a interação deles com permanentes e a redução de custo que ele proporciona foram provavelmente negligenciadas, mas este foi apenas um sintoma da mudança de filosofia de design do jogo.
Hoje, todo card de Magic precisa fazer algo e, na maioria, esse algo envolve um efeito de ETB. Jogadores gostam de coisas que trazem um benefício ou tomam alguma ação no momento em que são jogados, seja comprar um card, colocar uma ficha em jogo e/ou destruir criaturas e isso não é novidade: desde Man-o’-War e Deranged Hermit, o ETB é uma das peças fundamentais para definir a jogabilidade tanto nas mesas competitivas quanto no Commander casual - e todo card de Magic é, essencialmente, feito para ser jogado.
Se algo mudou nesse sentido nos últimos anos, é apenas que os efeitos de entrar em jogo ficaram mais eficientes e, por acaso, o Standard atual tem a junção de peças perfeitas para fazer um deck voltado para esse tema funcionar como nenhum outro jamais funcionou.
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As chances e motivos para banir algo do Bounce hoje são poucos, mas existe um risco que será testado nos próximos meses: sempre vai sair algo para eles porque ETB é parte inerente do jogo, e enquanto o Esper Pixie será limitado pela quantidade de encantamentos poderosos que chegarem ao Standard, o Dimir Bounce tem passe-livre para usar qualquer card que parecer interessante.
Se Bounce dominar o formato - pode acontecer, não parece provável em um Standard com uma expansão nova a cada dois meses e meio -, o provável é que a Wizards aceite essa consequência natural das suas escolhas de design enquanto o arquétipo não bater os 25 a 30% de representação. Afinal, todo deck teve seu momento de brilho e de reivindicações no Standard durante todo o ano de 2024, então não será diferente em 2025.
O que pode mudar, e apenas no longo prazo, é a reavaliação de como os efeitos de Bounce devem ser aplicados. Se há um deslize em This Town Ain’t Big Enough é ele ser flexível demais por um custo muito baixo, então é possível que a equipe de design evite redução de custos e/ou valores de mana muito baixos para efeitos capazes de fazer seu controlador reaproveitar duas, ou mais permanentes.
Até lá, recomendo aproveitar ao máximo o que o Bounce pode nos oferecer. Afinal, são raros os momentos em que uma estratégia que parece vinda do Pauper consegue fazer sucesso e ter viabilidade e impacto competitivo em formatos com níveis de poder mais altos.
Obrigado pela leitura!
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